quinta-feira, 29 de maio de 2014



Fernando Liguori


A Āyurveda considera o diabetes como uma disfunção sistêmica que afeta a água no corpo (ambhuvaha srotas) ou um desequilíbrio no metabolismo aquático. O diabético geralmente sofre de urina profusa por conta deste desequilíbrio. A Āyurveda lista inúmeros distúrbios que podem causar o diabetes em concordância com os doṣas. Ela classificada de duas maneiras: diabetes insipidus e diabetes mellitus.

Classificação corrente

O diabetes insipidus (DI) é causada quando a glândula pituitária tem um problema na produção do hormônio vasopressina, também conhecido como AVP, ou quando a ação do AVP não funciona mais eficientemente nos rins. Isto significa que o corpo produz uma maior quantidade de urina pelos rins, porque não são capazes de reter a água.

É importante salientar que o diabetes insipidus não está relacionada com o diabetes mellitus, exceto que, quando não tratada, pacientes com ou condição de pode ter os sintomas de sede extrema e da necessidade de urinar frequentemente. No diabetes insipidus não há qualquer problema com o nível de glicose ou de insulina no sangue.

O diabetes insipidus é muito menos comum do que o diabetes mellitus. Em muitos casos não há uma causa óbvia para a incapacidade da pituitária produzir o AVP (algumas vezes chamado hormônio anti-diurético ou ADH). Em outras pessoas uma inflamação ou infecção em torno da glândula pituitária, ou uma lesão na cabeça pode levar à perda da secreção de AVP. Operações sobre a glândula pituitária também podem levar à diabetes insipidus, mas, como no caso de uma lesão na cabeça, esta é muitas vezes temporária.

O diabetes mellitus (DM) não e uma única doença, mas um grupo heterogêneo de distúrbios metabólicos que apresentam em comum à hiperglicemia. Essa hiperglicemia é o resultado de defeitos na ação da insulina, na secreção de insulina ou em ambos.

A classificação atual do DM é baseada na etiologia e não no tipo de tratamento, portanto os termos diabetes mellitus insulinodependente e diabetes mellitus insulinoindependente devem ser eliminados. A classificação proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Associação Americana de Diabetes (ADA) e aqui recomendada inclui quatro classes clinicas: DM tipo 1, DM tipo 2, outros tipos específicos de DM e diabetes mellitus gestacional. Ainda existem duas categorias, referidas como pré-diabetes, que são a glicemia de jejum alterada e a tolerância à glicose diminuída. Essas categorias não são entidades clínicas, mas fatores de risco para o desenvolvimento do DM e de doenças cardiovasculares (DCV).

O DM tipo 1 (DM1), forma presente em 5 a 10% dos casos. É o resultado de uma destruição das células beta pancreáticas com consequente deficiência de insulina. Na maioria dos casos essa destruição das células beta é mediada por auto-imunidade, porém existem casos em que não há evidencias de processo auto-imune, sendo, portanto, referida como forma idiopática do DM1. Os marcadores de auto-imunidade são os auto-anticorpos: antiinsulina, antidescarboxilase do acido gluta-mico (GAD 65) e antitirosina-fosfatases (IA2 e IA2B). Esses anticorpos podem estar presentes meses ou anos antes do diagnostico clínico, ou seja, na fase pré-clínica da doença, e em ate 90% dos indivíduos quando a hiperglicemia é detectada. Alem do componente auto-imune, o DM1 apresenta forte associação com determinados genes do sistema antígeno leucocitário humano (HLA), alelos esses que podem ser predisponentes ou protetores para o desenvolvimento da doença.

A taxa de destruição das células beta é variável, sendo em geral mais rápida entre as crianças. A forma lentamente progressiva ocorre geralmente em adultos e é referida como latent autoimmune diabetes in adults (LADA).

O DM1 idiopático corresponde a uma minoria dos casos. Caracteriza-se pela ausência de marcadores de auto-imunidade contra as células beta e não-associação com haplótipos do sistema HLA. Os indivíduos com essa forma de DM podem desenvolver cetoacidose e apresentam graus variáveis de deficiência de insulina.

Como a avaliação dos auto-anticorpos não é disponível em todos os centros, a classificação etiologica do DM1 nas subcategorias auto-imune e idiopático pode não ser sempre possível.

O diabetes mellitus tipo 2 (DM2) é a forma presente em 90 a 95% dos casos e caracteriza-se por defeitos na ação e na secreção da insulina. Em geral ambos os defeitos estão presentes quando a hiperglicemia se manifesta, porem pode haver predomínio de um deles. A maioria dos pacientes com essa forma de DM apresenta sobrepeso ou obesidade, e cetoacidose raramente desenvolve-se espontaneamente, ocorrendo apenas quando associada a outras condições como infecções. O DM2 pode ocorrer em qualquer idade, mas é geralmente diagnosticado após os 40 anos. Os pacientes não são dependentes de insulina exógena para sobrevivência, porem podem necessitar de tratamento com insulina para a obtenção de um controle metabólico adequado.

Diferentemente do DM1 auto-imune não há indicadores específicos para o DM2. Existem provavelmente diferentes mecanismos que resultam nessa forma de DM, e com a identificação futura de processos patogênicos específicos ou defeitos genéticos, o numero de pessoas com essa forma de DM irá diminuir a custa de uma mudança para uma classificação mais definitiva em outros tipos específicos de DM.

Classificação ayurvédica

O diabetes se manifesta inicialmente como excesso de sede e urina. No começo o diabetes se manifesta como um distúrbio de kapha, causado pelo consumo excessivo de açúcar, comidas kaphogênicas e pela obesidade. Kapha aumenta no estômago devido à incapacidade funcional do pâncreas, atingindo outros tecidos, causando excesso e turvação de urina.

O diabetes de longo prazo ou até mesmo o juvenil se apresenta como excesso de sede e perda de tecidos, se tornando um distúrbio de vāta, principalmente no diabetes mellitus. Vāta se acumula no intestino grosso e atinge o pâncreas, perturbando suas funções.

Pitta também pode causar diabetes de ambos os tipos. Pitta se acumula no intestino delgado e atinge o fígado e o pâncreas, perturbando suas funções. Além disso, o agni elevado de pitta pode queimar o pâncreas.

Tratamento geral para diabetes

A melhor erva e a mais comum utilizada para harmonizar as funções do fígado e do pâncreas é o açafrão. Toma-se o açafrão em pó (1 a 3 gramas) três vezes ao dia com um pouco de suco ou gel de ale vera.

A principal erva ayurvédica para complicações severas de longo prazo é a shilajit, usualmente ingerida na forma composta. Outra importante erva ayurvédica é a gurmar. Ela possui propriedades anti-diabéticas e é objeto de estudo internacional por doutores e cientistas na área da Āyurveda. Sushrut, um grande médico ayurvédico do passado, descobriu a eficácia da gurmar em destruir a ação do açúcar no organismo (gur-mar significa a destruidora de açúcar). Ela contém o aumento do nível de açúcar no sangue. É usualmente administrada com shilajit (faz parte do composto de shilajit).

A maioria das substâncias amargas ajudam a controlar o metabolismo do açúcar, principalmente a genciana. Especiarias como gengibre e cardamomo auxiliam na digestão dos açucares. Guggul e mirra são úteis no controle da obesidade e possuem propriedades que regulam a taxa de açúcar no sangue.

Na terapia com gemas, pedras conectadas a Júpiter como a safira ou o topázio amarelo auxiliam o corpo a metabolizar o açúcar. Geralmente são usadas com estrutura de ouro no dedo indicador da mão direita.

Tratamento yogī para diabetes

1. meditação

A mente, através do sistema nervoso, controla todas as ações e reações que ocorrem no organismo humano. Ela mantém um registro de tudo o que a pessoa e seu corpo experienciaram no passado e apresenta isso, no presente, em condições que refletem essas experiências. Dessa função vem as decisões que regulam todas as ações, sejam elas voluntárias ou involuntárias. Essa função se estende desde o inconsciente e controle automático dos órgãos e músculos até as decisões tomadas conscientemente. Todo funcionamento existencial está baseado nas funções do sistema nervoso.

A ciência do Yoga sustenta que o sistema nervoso (e o corpo que ele regula) pode ser mantido sob controle e pode operar em sua máxima capacidade de eficiência através da prática da meditação. Essa teoria antiga já foi reforçada por pesquisas científicas conduzidas na Índia, Europa, América e outros países. Grandes partes destas pesquisas demonstraram de forma conclusiva que a prática diária da meditação provoca uma mudança harmoniosa no organismo humano.

No que concerne o diabetes, a prática meditativa demonstrou seu auxílio definitivo na regulação das glândulas endócrinas através do relaxamento do sistema nervoso simpático em práticas como, por exemplo, ajapa-japa. Os hormônios hipofisários, que estão sob o controle direto do hipotálamo, são drasticamente afetados e regulados pela prática de yoga-nidrā. Além disso, um aumento da eficiência mental é reconhecidamente adquirido através destas práticas.

2. haṭha-yoga

De igual importância no tratamento do diabetes são as práticas do haṭha-yoga denominadas śankhaprakṣalana e kunjal-kriyā. A prática de śankhaprakṣalana limpa sistematicamente o trato alimentar que vai da boca ao ânus. Neste kriyā, uma grande quantidade de água salinizada, morna, é ingerida, dois copos por vez, alternando com cinco āsanas especiais. Estes āsanas abrem os músculos dos esfíncteres que controlam os movimentos digestivos e intestinais, o que faz com que a água passe rapidamente por todo o trato. Após alguns copos e movimentos com os āsanas, o praticamente começa a ir ao banheiro e expelir o conteúdo do intestino misturado com a água. A prática só se torna efetiva quando já não há material intestinal (fezes), e a água sai limpa e cristalina pelo ânus assim como entrou pela boca.

Em conjunto com a meditação e o śankhaprakṣalana, uma série de āsanas e prāṇāyāmas deve ser administrada no tratamento do diabetes. As posturas ajustam as funções dos órgãos envolvidos pela regulação dos impulsos nervosos e fluxo sanguíneo nas áreas glandulares e pela massagem sutil que proporciona nas glândulas e órgãos. Prāṇāyāma controla a energia corporal, permitindo o fluxo livre das forças vitais para as áreas que requerem energia extra. O cérebro, o pâncreas e os outros órgãos podem ser revitalizados conscientemente e sistematicamente.

Programa de práticas yogīs para diabetes

O programa terapêutico que se segue tem sido utilizado pela Bihar School of Yoga no tratamento do diabetes e no fortalecimento do corpo e da mente debilitados pela doença. A prática do Yoga possui efeitos poderosos que provocam mudanças profundas e sutis no complexo corpo-mente. Portanto, cada aspecto da prática deve ser selecionado apropriadamente e executado cuidadosamente. De outra maneira, o objetivo desejado não será alcançado e sob algumas circunstâncias, o efeito pode ser contrário. O programa de yoga-terapia para diabetes deve ser prescrito individualmente segundo cada caso e deve ser supervisionado por um professor qualificado. Ao mesmo tempo, as práticas devem ser aprendidas corretamente e executadas de maneira suave e relaxante.

O programa de práticas é dividido em três estágios e existe um avanço nas técnicas de cada um deles. Três meses são recomendados para cada estágio e este tempo pode ser prolongado levando em consideração as necessidades individuais. Apenas avance para o próximo estágio após ter executado todas as técnicas do estágio anterior com facilidade, sem tensão física ou mental, pelo período de pelo menos um mês de proficiência. Isso significa que cada estágio será executado no término de quatro meses. Isso garantirá muitos benefícios terapêuticos. Na medida em que se familiarizar com as práticas você será capaz de ajustar o programa segundo suas necessidades. Quando avançar para os estágios dois e três, as práticas do primeiro estágio podem continuar sendo executadas. Seu valor e efeito não devem ser negligenciados. Você notará que as práticas de Yoga não são difíceis de executar. O que se requer é tempo e certo grau de esforço. Mantendo um sentido de continuidade na execução do programa você se sentirá ricamente renovado pelas mudanças que elas irão proporcionar.

Este programa terapêutico é destinado às pessoas que não possuem complicações severas no diabetes, quer dizer, sem a associação de qualquer outra desordem como hipertensão, doenças cardíacas, pressão alta. Se você possui qualquer outro problema além do diabetes, consulte um yoga-terapeuta qualificado para uma orientação apropriada antes de dar início às práticas. Este é o caminho mais seguro e mais rápido que encontramos para mantê-lo em segurança sob quaisquer circunstâncias. Esteja a par das contraindicações de cada técnica e consulte seu yoga-terapeuta. Como os efeitos do Yoga são cumulativos, os níveis de açúcar no sangue podem cair drasticamente.

Lembre-se: o tratamento do diabetes através do Yoga é um processo que envolve técnica. Ele não deve ser executado sem a devida orientação de um professor de Yoga qualificado. Todas as práticas devem ser aprendidas diretamente de um professor de Yoga. O programa e as técnicas sugeridas a seguir servem apenas como orientação. O yoga-terapeuta saberá onde deve mexer na estrutura do programa que agora esboçamos.

Estágio 1
1.    Jala-neti: diariamente.
2.    Śankhaprakṣalana: comece após um mês de prática (duas vezes por semana durante um mês e depois uma vez por semana até o fim do tratamento.
3.    Tadāsana: três ciclos.
4.    Trikonāsana: três ciclos. Inicie com a variação 3 e gradualmente execute as variações 1 e 2.
5.    Utthita-lolāsana: cinco ciclos.
6.    Kati-cakrāsana: cinco ciclos.
7.    Pavanmuktāsana 1: seis a dez ciclos.
8.    Pavanmuktāsana 2: toda a série, duas vezes cada movimento, pelo período mínimo de duas semanas. Execute de três a oito ciclos.
9.    Marjarī-āsana: cinco a oito ciclos.
10. Bhujaṃgāsana: três ciclos.
11. Śaśankāsana: dez a vinte e sete respirações abdominais nesta postura.
12. Meru-vakrāsana: onze ciclos.
13. Respiração yogī em śavāsana: vinte e sete ciclos.
14. Nāḍī-śodhana-prāṇāyāma: técnica 1 e 2 – 1:1. Comece com uma contagem confortável e gradualmente aumente o tempo até 10:10. Doze ciclos.
15. Bhrāmarī-prāṇāyāma: doze ciclos.
16. Mūla-bandha: dez ciclos.
17. Relaxamento | yoga-nidrā.

Estágio 2
1.    Jala-neti: em dias alternados.
2.    Śankhaprakṣalana e kunjal-kriyā (com jala-neti): duas vezes por semana por um mês; depois, uma vez por semana.
3.    Sūrya-namaskāra: três a cinco ciclos.
4.    Śavāsana com respiração abdominal até que os batimentos cardíacos e a respiração se normalizem.
5.    Śaśank-bhujaṃgāsana: cinco ciclos.
6.    Naukāsana: três ciclos.
7.    Tadagi-mudrā: três ciclos x 10.
8.    Gomukāsana: uma vez para cada lado aumentando gradualmente a permanência na posição final.
9.    Ardha-matsyendrāsana: uma vez para cada lado aumentando gradualmente a permanência na posição final.
10. Viparītakaraṇī-āsana: dez segundos a um minuto.
11. Matsyāsana: dez segundos a um minuto.
12. Agnisar-kriyā: comece com swana-prāṇāyāma e após um mês agnisar. Dez a vinte respirações, três ciclos.
13. Nāḍī-śodhana-prāṇāyāma: técnica 2 – 1:2. Gradualmente desenvolva a técnica 3 – 1:1:1, cinco ciclos.
14. Bhrāmarī-prāṇāyāma: doze ciclos ou ujjayī-prāṇāyāma por cinco minutos.
15. Mūla-bandha: técnica 2 com retenção interna. Cinco ciclos.
16. Relaxamento | yoga-nidrā.
17. Ajapa-japa: técnica 1 (passagem frontal, estágios 1, 2 e 3), um mês para cada estágio. Dez a quinze minutos à noite.

Estágio 3
1.    Jala-neti: duas vezes por semana.
2.    Śankhaprakṣalana e kunjal-kriyā: uma veze na semana ou de quinze em quinze dias, dependendo das necessidades.
3.    Sūrya-namaskāra: cinco a doze ciclos.
4.    Śavāsana com respiração abdominal por vinte e sete fôlegos.
5.    Pavanmuktāsana 2: toda a série.
6.    Supta-urdarakarśanāsana: cinco ciclos.
7.    Dhanurāsana: três ciclos, aumentando gradualmente a permanência na postura final.
8.    Paścimottānāsana: três ciclos.
9.    Sarvāṅgāsana | viparītakaraṇī-āsana: de dez segundos a um minuto.
10. Matsyāsana: de dez segundos a um minuto.
11. Yogamudrāsana: de dez segundos a um minuto.
12. Gomukhāsana: uma vez para cada lado.
13. Ardha-matsyendrāsana: uma vez para cada lado aumentando gradualmente a permanência na posição final.
14. Bhastrikā: três a cinco ciclos de vinte fôlegos. No segundo mês introduza jālaṃdhara e mūla-bandha no fim de cada ciclo.
15. Nāḍī-śodhana-prāṇāyāma: técnica 3 – 1:1:2 estendendo, eventualmente, para 1:2:2. Cinco ciclos.
16. Bhrāmarī-prāṇāyāma: doze ciclos ou ujjayī-prāṇāyāma por cinco minutos.
17. Relaxamento | yoga-nidrā.
18. Ajapa-japa: técnica 2 (passagem espinhal, estágios 1, 2 e 3), um mês para cada estágio. Dez a vinte minutos à noite.


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