segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014



Fernando Liguori


Eu tenho recebido algumas mensagens sobre «viagem» ou «desdobramento» astral. Sempre tenho a mão este texto quando o tema «corpo astral» é relevante. Existe uma noção equivocada sobre viagem astral. Um corpo astral bloqueado impede o acesso a qualquer desdobramento ou prática espiritual mais intensa.


O prāṇamaya-kośa ou corpo de luz é a estrutura energética por trás do corpo físico, o annamaya-kośa. Devido ao estilo de vida e a superestimulação dos sentidos orientados para satisfação dos desejos, o prāṇamaya-kośa encontra-se bloqueado na maioria das pessoas. Esse bloqueio energético e psíquico afeta todos os outros kośas, principalmente o annamaya-kośa e o manomaya-kośa, impedindo a experiência dos kośas superiores. Um prāṇamaya-kośa bloqueado é um perigo até mesmo para práticas de Yoga mais avançadas, principalmente o prāṇāyāma. Por este motivo as práticas de prāṇāyāma sempre foram mantidas em segredo e passadas adiante somente de boca a ouvidos, de guru para discípulo. Se alguém com sérios bloqueios no prāṇāmaya-kośa tenta executar prāṇāyāma sem a devida orientação, pode agravar de maneira significativa o vāta, provocando distúrbio de energia no sistema nervoso. Por isso os sistemas mais tradicionais de Yoga e a Āyurveda aconselham que o prāṇāyāma seja orientado segundo as condições particulares de cada praticante.

Existem cinco chaves para desbloquear a percepção e a experiência do prāṇāmaya-kośa. Estas chaves são: respiração psíquica, passagem psíquica, centros psíquicos, som psíquico e símbolo psíquico. Mas antes de examinarmos cada uma destas chaves, vamos fazer uma pequena retrospectiva acerca do prāṇāmaya-kośa.

O prāṇāmaya-kośa

Muitos anos atrás, os ṛṣis (videntes) e munis (sábios) disseram que o prāṇa não está confinado no corpo físico grosseiro, mas em um corpo refinado e sutil conhecido como prāṇamaya-kośa ou invólucro prânico. Este corpo, eles descreveram como tendo uma aparência anuviada, em constante atividade em seu interior. Deste corpo refinado, muitas cores são emitidas, dependendo da dieta, pensamento, estado de consciência no momento da meditação e até mesmo do ambiente externo.

De acordo com o Yoga, o prāṇamaya-kośa forma uma rede sutil através do qual o prāṇa flui. Ele também é conhecido como corpo etério, bioplasmático, prânico ou astral. Possui a mesma forma que o corpo físico. Contudo, através de certas técnicas yogīs, concentração e visualização, o praticante é capaz de fazê-lo se expandir ou se contrair, especialmente através da técnica de prāṇa-vidyā. Se nossa percepção estiver firmemente sintonizada com o corpo prânico, seremos capazes de vê-lo com suas milhares de estruturas delicadas que conduzem a śakti ou energia. Estas delicadas estruturas são as nāḍīs, fluxos de energia prânica. Existem milhares e milhares de nāḍīs dentro do corpo grosseiro e elas distribuem a consciência e o prāṇa a cada átomo.

Este campo prânico é às vezes chamado de psi-plasma, devido ao fato de estar conectado ao plasma (gases carregados) estudados na física. São vapores carregados com partículas que podem ser afetadas internamente pela mente e externamente pela eletricidade e campos magnéticos ou eletromagnéticos.

A densidade do corpo prânico naturalmente gravita e é atraída a regiões mais sutis, devido à interação das partículas em seu interior. Portanto, existe atividade constante dentro do corpo prânico. Sob a ação de diferentes práticas yogīs tais como o prāṇāyāma, mudrā, bandha, os ṣaṭ-karmāṇis do haṭha-yoga e prāṇa-vidyā, essa interação é largamente acelerada. Os diferentes campos prânicos são forçados a se unirem, provocando calor ou frio no corpo, leveza na região da cabeça, introversão, apetite, percepção sutil de cores e sons nas práticas de concentração (dhāraṇā) e abstração sensorial (pratyāhāra). Muitas destas experiências ocorrem mais rápido através da prática do prāṇāyāma, que é muitas vezes muito poderoso para iniciantes no Yoga.

No Yoga, o conceito de prāṇa é científico. Quando nós falamos de prāṇa não queremos dizer respiração, ar ou oxigênio. Precisamente e cientificamente falando, prāṇa é a força de vida origial subjacente a toda criação. Prāṇa é uma palavra sânscrita formada por duas sílabas: pra e an. An significa movimento e pra é um prefixo cujo significado é constante. Portanto, prāṇa significa movimento constante. Esse movimento constante se inicia logo quando somos concebidos no ventre de nossas mães.

No corpo físico nós temos dois tipos de energia. Uma é conhecida como prāṇa-śakti e a outra é conhecida como manas ou citta-śakti. Prāṇa-śakti representa a energia vital ou o dinamismo enquanto que manas-śakti representa a energia mental. Isso significa que em cada órgão do corpo existem dois canais de abastecimento energético. A fisiologia moderna descreve dois tipos de sistemas nervosos, o sensorial ou sistema informativo e o sistema motor, em adição aos dois sistemas simpático e parassimpático. Estes dois sistemas estão interconectados com cada órgão do corpo. Da mesma maneira, cada órgão é abastecido com energia prânica e mental.

Respiração psíquica

A respiração psíquica é a primeira chave para consciência prânica. É a integração da respiração física com a consciência. A experiência da respiração pode ser tanto grosseira quanto sutil. A base da respiração psíquica é a respiração física grosseira, na forma do ar movendo-se pelas narinas, aproximadamente quinze vezes por minuto, 21, 600 vezes a cada vinte e quatro horas, estando você consciente ou não deste processo. A experiência grosseira da respiração é o processo de sugar o ar para dentro dos pulmões e então expeli-lo através das narinas. A manipulação deste processo respiratório grosseiro através do poder da vontade e da concentração é um aspecto do prāṇāyāma; o segundo aspecto é a respiração psíquica.

Nos estágios iniciais da respiração psíquica o único requisito é a consciência psíquica da respiração. Ou seja, tornar-se consciente da respiração sem afetar o fluxo natural do ciclo respiratório. Uma vez que isso seja conquistado, o movimento da respiração através da inspiração e expiração deve ser experienciado na forma do ujjāyī-prāṇāyāma. Consciência profunda do som e vibração criado durante a execução do ujjāyī-prāṇāyāma e seu movimento durante a inspiração e expiração completa o processo inicial da respiração psíquica.

Ujjāyī-prāṇāyāma envolve a prática da consciência, concentração e contração fisiológica dos músculos da garganta. Durante a prática de ujjāyī-prāṇāyāma, que pode ser executado junto com khecarī-mudrā e nasikagra-dṛṣṭi, deve haver consciência do movimento e do som da respiração na medida em que ela passa através da garganta.

Como esta experiência abre a percepção do prāṇamaya-kośa? É simples. Quando se pratica a respiração psíquica e se coloca a consciência total no movimento e som da respiração na garganta, a mente começa a relaxar e novas experiências ocorrem dentro do padrão da personalidade. Quando praticamos ujjāyī, a experiência fisiológica imediata é o relaxamento, a tranqüilidade e o unidirecionamento da mente. Essa é a experiência grosseira de ujjāyī, então ocorre à experiência psíquica.

Na medida em que praticamos ujjāyī começamos a movimentar o prāṇa. A primeira manifestação de mahā-prāṇa é o prāṇa localizado na região do peito. A primeira experiência fisiológica que surge do movimento e despertar do prāṇa é na forma de uma torrente de luz branca ou como um tipo de cócegas ou sensação de queimação na garganta, peito e pulmões. Contudo, na medida em que a concentração se torna mais profunda e intensa, experienciamos o prāṇa de forma mais penetrante. É quando ele satura as células de energia.

Passagem psíquica

A segunda chave para consciência prânica é a passagem psíquica. Esta é qualquer passagem no corpo através do qual a consciência, a respiração e o prāṇa são dirigidos em um jorro de força combinada. Não é um conceito limitado porque podemos fazer uma passagem psíquica em qualquer lugar ou parte do corpo, de um lado ao outro. Uma vez que a passagem é visualizada, a respiração psíquica pode se movimentar para qualquer lugar no corpo através do ujjāyī-prāṇāyāma. Isso provocará uma transferência prânica. A respiração psíquica é uma parte integral do prāṇa e ela deve ser aperfeiçoada ao ponto de se tornar extremamente sutil e espontânea.

Na prática do prāṇa-vidyā, por exemplo, muitas passagens psíquicas são criadas, uma após a outra, para que o prāṇa possa ser distribuído para todas as partes do corpo. Algumas são rotas longas e complexas, outras são curtas e simples. Contudo, para o propósito de despertar o prāṇa, três passagens psíquicas são as mais importantes e elas devem ser purificadas e abertas antes de se iniciar as práticas de prāṇa-vidyā.
A primeira passagem psíquica usualmente experienciada é a passagem frontal que se estende do maṇipūra-kṣetraṃ na região do umbigo ao viśuddhi-kṣetraṃ na cavidade da garganta. Esta é a passagem usada nos primeiros estágios de ajapa-japa e ajapa-dhāraṇā. A passagem frontal completa, como a suṣumṇā-nāḍī na espinha, se estende do mūlādhāra ao ājñā-cakra. Os cakra-kṣetraṃs ou pontos de disparo para ativação dos cakras na espinha se encontram nesta passagem.

A passagem mais poderosa é a suṣumṇā-nāḍī que se ergue ereta, para cima, por dentro da coluna espinhal. Este é o caminho através do qual a kuṇḍalinī desperta viaja do mūlādhāra ao sahasrāra e é representado simbolicamente pelo rio sarasvatī. Os cakras principais e a experiência de seu despertar estão situados ao longo desta passagem. Os pontos localizados ao longo da espinha são conhecidos como cakra-śarīra (corpo do cakra).

Após a suṣumṇā, iḍā e piṅgalā-nāḍīs são os canais psíquicos mais importantes, embora apenas piṅgalā seja usada como passagem psíquica. Isso porque quando iḍā é utilizada como canal psíquico, a força mental se torna dominante, o que pode causar a perda da vitalidade prânica e da estabilidade mental. Piṅgalā, também conhecida como sūrya-nāḍī, a nāḍī do sol, é representada simbolicamente pelo rio yamunā. Iḍā é conhecida como candra-nāḍī, a nāḍī da lua, e é representada pelo rio gaṅga.

O ājñā-cakra é representado simbolicamente pelo prayaga, o local exato de encontro entre o rio gaṅga (iḍā-nāḍī), o rio yamunā (piṅgalā-nāḍī) e o rio sarasvatī (suṣumṇā-nāḍī). Do ājñā, eles prosseguem como um rio apenas, um fluxo de consciência. Após o ājñā não existe diferença entre prāṇa e consciência. Existe apenas uma consciência cósmica se movendo para cima.

A prática de prāṇa-vidyā capacita o praticante a experienciar o fluxo e a cor do prāṇa na medida em que ele flui para o alto através da piṅgalā-nāḍī. Às vezes estas passagens são vistas como fios transluzentes de uma grande teia de aranha que brilham no amanhecer. Uma pessoa pode ver pequenos pontos luminosos ou jóias cintilantes penduradas em um cordão prateado. Estes são os sutis e misteriosos cakras situados ao longo da suṣumṇā-nāḍī. Estas experiências ocorrem gradativamente na medida em que nos purificamos através das práticas yogīs. Elas são indicações de que estamos fazendo progresso e começando a ficar proficientes na técnica do prāṇa-vidyā.

Centros psíquicos

A terceira chave para consciência do prāṇa são os centros psíquicos ou cakras. Estes centros são vórtices sutis de prāṇa localizados em pontos específicos ao longo da suṣumṇā-nāḍī. Os centros psíquicos foram descobertos por yogīs, ṛṣis e munis de várias tradições da Índia e de todo o mundo. Eles têm sido vistos não pela dissecação física do corpo, mas pela introspecção psíquica. Do conhecimento destes centros (cakra-vidyā), a espetacular ciência do kuṇḍalinī-yoga foi desenvolvida, e ela encerra o segredo do despertar dos cakras.
De acordo com o conceito de prāṇa-vidyā, o prāṇa é gerado no mūlādhāra, armazenado no maṇipūra, purificado no viśuddhi e distribuído pelo ājñā-cakra. Estes são os quatro cakras utilizados na prática de prāṇa-vidyā. Precisamos nos tornar conscientes de como cada cakra influencia a atividade da energia prânica e qual a experiência que ocorre quando os vários cakras são despertos. Com as técnicas de prāṇa-vidyā, os cakras podem ser despertos rapidamente se as práticas forem executadas com diligência. Isso não irá ocorrer espontaneamente. Precisamos estimular, influenciar e controlar o prāṇa, e isso precisa ser feito gradualmente e com cuidado.

Som psíquico

A quarta chave para consciência do prāṇa é o som psíquico. De acordo com o nāda-yoga, o som se manifesta tanto dentro de nós quanto fora. As práticas de nāda-yoga envolvem a retração da percepção auditiva para que, durante sua execução, não escutarmos os sons externos do ambiente. Quando nossa atenção está completamente retraída no centro da cabeça, conseguimos desenvolver a consciência do cidākāśa, o espaço psíquico dentro da cabeça. Podemos então observar qualquer som que surge espontaneamente dentro deste espaço.

As experiências provenientes do nāda são, para citar algumas, em um grau elevado de sutileza: o som de sinos, abelhas, trovões, flautas, tambores ou vina. Normalmente, os sons começam a aparecer de forma bem sutil, aumentando gradativamente sua intensidade. Sons de sinos ou tambores podem ser escutados mesmo que não haja sinos ou tambores no ambiente. A experiência é completamente interna.

Após todos estes sons internos estarem estabelecidos na consciência, uma profunda vibração (nāda-spandana) sonora pode ser experimentada, não só nos ouvidos ou cabeça, mas por todo o corpo, como se cada célula do corpo vibrasse em consonância com todo o universo. No fim desta experiência, nos tornamos conscientes do nāda mais recôndito, o som transcendental ou pranava, Oṃ.

Símbolo psíquico

A quinta chave para consciência prânica é o símbolo psíquico, experienciado durante as práticas de concentração. O símbolo pode ser qualquer objeto no qual possamos fixar nossa mente. Pode ser um símbolo abstrato, paisagem, yantra ou maṇḍala, o sol, a lua, a chama da vela, nuvem ou qualquer coisa que nos atraia. Pela concentração na imagem do símbolo, gradualmente desenvolvemos a capacidade de ver internamente, de forma clara como se estivéssemos com os olhos abertos.

Dependendo de nossa personalidade e signo astrológico, o símbolo é dado no momento do mantra-dīkṣā (iniciação pelo mantra). Ele então deverá ser utilizado nas práticas de concentração para nos capacitar a ir profundamente aos rincões de nossa mente. Isso nos auxiliará nas práticas mais avançadas de prāṇāyāma também.


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