sábado, 29 de março de 2014



Fernando Liguori


Mantra é a quinta prática de Yoga descrita nas Upaniṣads do Yoga. Muitas vezes, a palavra mantra é traduzida como vibração sonora, mas o significado literal da palavra mantra é a força que liberta a mente de sua escravidão. Em sânscrito, a palavra mantra é derivada de algumas raízes: mananāt (escravidão da mente), trayate (liberado, libertado) e mantraḥ (força da vibração). O que é essa força que liberta a mente de sua escravidão? De acordo com o Yoga, a mente grosseira ou a natureza mental possui dois atributos que a mantém escravizada. A primeira é mala que significa impureza e a segunda é vikṣepa que significa dispersão. Portanto, a mente grosseira é composta por impurezas e é predominantemente dispersa.

O que são essas impurezas? Elas são a causa de nossa atração às qualidades tamásicas e rajásicas da vida, o que limita as faculdades da mente, fazendo com que ela atue, experiencie e se comporte de maneira programada. Uma natureza tamásica ou rajásica é expressa por uma mente obscurecida e apegada. Portanto, a atração por essas qualidades na vida é chamada mala. Vikṣepa é o sentimento de dispersão atuando na vida. Nós sempre queremos algo mais, algo diferente, algum tipo de diversão. Isso é uma distração da mente, vikṣepa. A mente só salta de um lado para o outro como um macaco bêbado porque ela quer se divertir. Se não existe o desejo pela diversão, a mente se torna absolutamente quieta, estável, tranquila e pacifica. Se olharmos todos os aspectos da vida sob este prisma, notaremos a importância de se cultivar um estilo de vida mais natural e saudável, um estilo de vida yogī. Este desejo por diversão é vikṣepa. O propósito do mantra é libertar a mente do padrão de diversão e dissipação que ela constantemente busca, da atração às qualidades rajásicas e tamásicas da vida que satisfazem as ambições e desejos que fortalecem a identidade egóica.

Mantra é vibração. O mantra supremo é conhecido como anāhada-nāda, o som não estruturado ou a vibração interior do átomo. É a vibração do som sem som. Aqui reside a ciência da física yogī. Onde quer que haja movimento também há o pulsar da vibração que cria, em contra partida, um som ainda mais sutil. Os átomos estão constantemente em movimento, criando uma série de vibrações. Mas como nos tornamos conscientes destas vibrações sutis? Através do processo de sensibilização da consciência e do aprofundamento no corpo psíquico.

A mente é somente um aspecto do mantra-yoga. O corpo psíquico e a vibração sonora são os outros dois aspectos.

Aspecto mental

Vamos primeiro considerar a mente que, na terminologia yogī, é uma força sutil, não uma força física. Com o propósito de ilustrar o funcionamento da mente como uma força não-física, o Yoga provê o exemplo da ameba, uma criatura unicelular. A ameba não possui cérebro ou nervos, mas mesmo assim responde a estímulos. Se um grão de arroz é colocado em sua frente, ela irá consumi-lo. Mas se uma gota de ácido é colocada em sua frente, ela irá circundar a gota e continuará seu caminho. O que permite que a ameba aceite o arroz e recuse o ácido?

O Yoga vê essa faculdade como uma força que dirige todo tipo de energia vital e expressão manifesta. Ela é chamada de mahat, a mente cósmica. Mahat é dividida em quatro princípios: manas, buddhi, citta e ahaṃkāra. Mahat é vista como uma energia que permeia toda estrutura humana, mas que se manifesta e se expressa dinamicamente em manas (a mente inferior e seu aspecto racional), buddhi (a mente superior e seu aspecto discriminativo, analítico e compreensivo), citta (a consciência que registra e armazena) e ahaṃkāra (o ego ou princípio de egoidade da identidade individual). Estes quatro princípios interagem com o mundo dos sentidos: nome, forma, ideia, tempo, espaço e objeto. Em síntese, essa é a visão yogī da mente.

Aspecto psíquico

O corpo psíquico é a manifestação densa do corpo sutil e causal ou do subconsciente e inconsciente. A área subconsciente é conhecida com o corpo sutil e o inconsciente é o corpo causal. A zona limite entre o subconsciente e o inconsciente é o corpo psíquico. O que o corpo psíquico significa? Os quatro estados da consciência: grosseiro, sutil, causal e transcendental que, por sua vez, são conhecidos como dois tipos de experiência no Yoga. O grosseiro e o sutil representam as experiências externas da mente. O causal e o transcendental representam as experiências internas da mente ou consciência. O corpo psíquico é a zona onde ambas as experiências externas e internas ocorrem.

O corpo psíquico se torna o elo entre as experiências externas (físicas e mentais) e os profundos níveis internos de vibração de toda a personalidade. Toda a teoria do kuṇḍalinī-yoga, que abrange os cakras, as nāḍīs e o despertar e ascensão da kuṇḍalinī, é experienciada no corpo psíquico. Portanto, os cakras são conhecidos como centros psíquicos. Mūlādhāra, swādhisṭhāna, maṇipūra e anāhata são os quatro centros psíquicos relacionados ao reino das experiências externas, tanto grosseiras quanto sutis. Viśuddhi, ājñā, bindu e sahasrāra se relacionam com as dimensões internas da psique.

Mūlādhāra representa a auto-identidade e a segurança; swādhisṭhāna representa os saṃskāras profundos; maṇipūra nos impulsiona a um dinamismo externo, muitas vezes exacerbado e o anāhata emoções e sentimentos, grosseiros ou sutis. Indo além deles, ao aspecto transcendental, refinado, a expansividade e a abertura sincera está viśuddhi. A faculdade intuitiva, trazendo sempre algo do desconhecido e traduzindo em termos conhecidos, está o ājñā. No bindu existe a consciência da fonte, o ponto onde as experiências macro e o microcosmicas se fundem em uma só. Finalmente, no sahasrāra, ocorre a iluminação. Estes quatro últimos centros psíquicos estão relacionados às experiências internas.

Todas estas experiências ocorrem no campo psíquico, que é constituído por diferentes formas vibratórias. Estas formas vibratórias produziram o som que pode ser compreendido pela mente inferior (manas, buddhi, citta e ahṃkāra). Estes sons são cinquenta em número e cada som ou forma vibratória é representado simbolicamente nas pétalas dos cakras como as letras do alfabeto sânscrito. Cada cakra é ativado pela repetição destas vibrações sonoras. Contudo, deve haver intensidade de concentração e consciência na repetição, do contrário serão palavras vagas, sem valor real. Seja entoando uma sílaba mântrica ou recitando uma página inteira de mantras, o efeito da prática será nulo sem concentração, consciência e intensidade mental.

A faculdade desenvolvida aqui é a concentração, a consciência, a intensidade e visualização do corpo psíquico em sua contraparte física. Os cakras não existem no corpo físico, mas é nele que eles são visualizados. Eles têm sido alocados em diferentes partes do corpo: mūlādhāra na região do períneo, swādhisṭhāna na região sacral, o maṇipūra na região lombar, anāhata na região torácica, viśuddhi na região da garganta, ājñā  no centro do cérebro, bindu no topo atrás da cabeça e o sahasrāra na coroa da cabeça. Estas são áreas no corpo físico que correspondem à localização dos cakras no corpo psíquico. A experiência da kuṇḍalinī e dos cakras ocorre no corpo psíquico que é uma passagem secundária para experiências mais profundas e níveis mais sutis de consciência. Portanto, kuṇḍalinī-yoga é considerado um dos métodos de Yoga mais rápidos através do qual o sādhaka (praticante) pode queimar muitas etapas. Contudo, isso requer uma atitude diferente e um entendimento mais refinado da personalidade humana, e não é qualquer pessoa que pode fazê-lo.

Aspecto sonoro da vibração

O terceiro aspecto do mantra é a vibração sonora que foi dividida em cinquenta sons. Diferentes combinações destes sons produziram diferentes formas de mantras. Por exemplo, o mantra oṃ namaḥ śivāya (eu saúdo a Śiva) é uma forma intelectual de se compreender ou uma tradução literal do mantra. Muitas pessoas mal interpretam o mantra, achando que ele é somente relativo à determinada deidade. Neste momento o cambapé mental se inicia: Estou sendo convertido? Eu terei que acreditar em alguma coisa que não conheço ou não entendo? Como posso acreditar nesse Śiva nu adornado com serpentes? Esse tipo de interpretação intelectual não é esperado ao se praticar mantra.

A repetição dos sons contidos no mantra oṃ namaḥ śivāya estimula e desperta as faculdades de diferentes cakras associados aos sons do mantra. Quando utilizamos a palavra som aqui, nos referimos à vibração sonora das letras do alfabeto sânscrito que, quando conjugadas, formam os mantras. Ṇaṃ é uma letra associada a um cakra, assim como ḍhaṃ, yaṃ ou ṣaṃ são outras letras associadas a outros cakras. Sahasrāra, o cakra mais elevado, contém mil pétalas, cada uma representando diferentes combinações dos cinquenta sons (ou letras) no plano cósmico. Assim, uma consoante pode ser entoada de doze maneiras diferentes: ka, , ki, , ke, kai, ku, , kou, kuṃ ou kaḥ. Portanto, as mil pétalas representam diferentes combinações destas cinquenta letras ou sons e o sahasrāra contém toda essa informação. Este é o DNA do corpo psíquico que armazena todas as informações que somente podem ser acessadas após dissecar e isolar a molécula do DNA.

Estes são os três aspectos do mantra-yoga: mente, corpo psíquico e vibração sonora. Agora, discutiremos os seguintes pontos:

·         Como são os diferentes tipos de mantra?
·         Como o mantra altera e afeta a personalidade mental?
·         Como o mantra desperta a personalidade psíquica?

Tipos de mantra

Vamos lidar agora com alguns tipos diferentes de mantras. Geralmente, mantras são sílabas ou palavras específicas que têm sido usadas por yogīs, sadhus, pesquisadores e pensadores para criar uma mudança em seu padrão energético. Tradicionalmente, dois tipos de mantras são reconhecidos: o mantra universal e o mantra individual.

Os mantras universais são largamente conhecidos e têm sido adotados por diferentes tradições para o uso em práticas meditativas e contemplativas. Exemplos de mantras universais são:

·         Mahā-mṛtyujaya-mantra:

oṃ trayambākaṃ yajāmahe
sugandhiṃ puṣṭivardhanam
urvārūkamivābandhanān
mṛtyor mukṣiya māmṛtāt

·         Gāyatrī-mantra:

oṃ bhūr bhuvaḥ svaḥ
tat savitur vareṇyaṃ
bhargo devasya dhīmahi
dhiyo yo naḥ prachodayāt

Estes mantras são compostos como um fio que conecta diferentes sons. Em cada um há a ênfase em um determinado tipo de som. No mahā-mṛtyujaya-mantra o som predominante é am, enquanto que no gāyatrī o som predominante é ha. É desta maneira que estas combinações foram realizadas pelos sábios yogīs com a finalidade de criar uma alteração energética e vibratória na consciência ativa e periférica.

Exemplos de mantras universais de comprimento razoável são:

·         Oṃ Namaḥ Śivāya
·         Oṃ Namo Bhāgavate Vāsudevaya
·         Oṃ Namo Nārāyāna

Mantras comuns mais curtos são o oṃ e o sohaṃ. Todos estes estão na categoria de mantras universais e podem ser recitados por qualquer pessoa, principalmente aquelas que procuram por uma compreensão mais profunda da personalidade mental, sutil e psíquica.

O segundo conjunto de mantras são os pessoais ou individuais. São mantras utilizados para propósitos específicos em ocasiões necessárias. Eles podem ser monossílabos (conhecidos como bīja-mantras) ou combinações de vários sons. O Yoga reconhece ambos os tipos de mantras. Diferentes tradições espirituais têm criado seus próprios mantras que despertam centros psíquicos particulares ou proveem o entendimento de determinadas faculdades mentais. Por exemplo, mantras tântricos como hrīṃ e klīṃ são combinações de diferentes consoantes e vogais unidas para criar uma mudança vibratória dinâmica dentro do padrão energético da personalidade. Mantras védicos como ahaṃ brahmasmi ou tattvamasi alteram o estado normal da consciência e retraem os sentidos internalizando as faculdades mentais.

Qualquer pessoa pode assumir uma prática com um mantra universal e mantê-la sem a guia de um professor mais experiente ou guru. Contudo, os mantras individuais são dados aos aspirantes por um professor de acordo com a personalidade e o tipo de mudança ou estímulo necessário para despertar os diferentes compartimentos da personalidade.

Como o mantra altera o padrão mental

Primeiro, seja lá qual a tradição que utilize e ensine mantra, o fator mais importante é perceber como ele altera os padrões da mente. O Yoga vê a estrutura mental como uma consciência predominantemente ativa cuja energia está adormecida; da mesma forma, o Yoga vê o padrão psíquico da personalidade como uma energia ativa cuja consciência se encontra adormecida. Embora a quantidade de energia e consciência possa ser igual, em um aspecto a consciência é mais ativa e em outro, a energia é mais ativa. Portanto, no padrão mental, a consciência é mais ativa. As faculdades de buddhi, manas, citta e ahaṃkāra são diferentes expressões de nossa consciência ativa. Prāṇa, cakras e kuṇḍalinī são diferentes manifestações da energia ativa. Essa é a principal diferença entre o corpo mental e psíquico.

Seja qual mantra for, quando começamos a repeti-lo com fixação mental, ocorre à concentração unidirecionada. Esse é o primeiro passo. Outras horas, quando não conseguimos nos concentrar, a mente pula de um ponto ao outro em busca de estímulo e diversão. Dessa maneira, as faculdades mentais e energia são dissipadas. A repetição do mantra interrompe a dissipação destes quatro compartimentos mentais. Uma vez que a dissipação cessa, a estabilidade ocorre nestas áreas. Elas se aquietam, suas atividades são interrompidas. A dissipação é como a janela aberta por onde passa o sopro do vento que levanta as cortinas e espalha os papéis da sala. Nossa personalidade é assim o tempo todo. Tudo fica bagunçado na sala de buddhi, manas citta e ahaṃkāra. Quando as janelas estão fechadas, a calma e a estabilidade ocorrem espontaneamente. O mesmo ocorre com mantra, i.e. a estabilidade mental é a primeira indicação da concentração mântrica.

Segundo, a prática de mantra-yoga equilibra ou nivela os processos mentais na medida em que as faculdades e energias que existem dentro de cada compartimento são equilibradamente distribuídas. O que isso significa? Novamente, vamos utilizar o exemplo do vento soprando pela janela aberta. Se você estiver na direção do vento poderá sentir sua força. Se não estiver em sua direção, pode não sentir o efeito intenso de sua força, mas ele continuará ali. A única diferença é que você não está sendo afetado diretamente pelo vento, pois não está em sua direção. Contudo, quando a janela se fecha, você pode andar por toda sala e sentir a calma e a estabilidade em todo ambiente. Não importa a direção que tome, sentirá por toda a parte a calma e estabilidade atmosférica. Não há nenhum vento soprando em qualquer parte da sala. É isso que queremos dizer com distribuir as energias e faculdades dentro de cada compartimento da mente. Neste estágio da prática do mantra-yoga, ocorre o equilíbrio e nivelamento das atividades mentais em cada compartimento, dessa maneira a mente se torna mais homogenia.

O terceiro passo no processo da repetição mântrica é a eliminação de tensões mentais. Quando somos confrontados a experiências particulares, ideias ou até mesmo no veículo de consciência, existe tanto tensão quanto relaxamento, como o efeito de ondas perpendiculares. Isso é o que normalmente ocorre quando experimentamos um fluxo contínuo de ideias, impressões ou situações em qualquer um dos quatro compartimentos mentais. Às vezes um desejo, uma emoção ou ambição ganha, momentaneamente, intensidade, isso cria tensão e desequilíbrio. Quando tais distrações ou desequilíbrios ocorrem, a tensão toma forma em um aspecto da consciência. Isso pode ser feito por um pensamento apenas. Pessoas caem em depressão pela má assimilação de seus próprios pensamentos e emoções. As pessoas têm ataques de ansiedade só porque algo está mudando. Por conta da tensão, cresce o sentimento de eu não consigo competir com isso. Portanto, a eliminação da tensão ou a atividade máxima da consciência ocorre no terceiro estágio do mantra-yoga. As ondas perpendiculares e seus efeitos se transformam em suaves ondas horizontais.

Neste processo, se há fraqueza em certos aspectos da consciência, resultando na inabilidade de enfrentar as situações da vida e a perda de auto-estima e auto-confiança, até mesmo aquelas fraquezas mais íntimas da personalidade se tornarão equilibradas pela prática de mantra. As atividades da consciência diminuem, se tornando mais lineares. Isso aumenta a auto-confiança, aperfeiçoa as atividades no dia-a-dia e podemos sentir a força e a energia crescerem desde o interior. Se existe problemas com o sono, com a prática de mantra uma pessoa pode voltar a dormir normalmente na medida em que as ondas da consciência deixam de subir e descer, tornando-se mais estáveis e lineares. Da mesma maneira, há um aumento de memória, concentração, expressão e interação. O aperfeiçoamento das faculdades da consciência que normalmente são expressas através da personalidade é o terceiro aspecto do mantra.

O quarto aspecto do mantra é sensibilizar a mente de tal maneira que seu alcance se torne como um radar capaz de detectar as vibrações mais sutis das pessoas, lugares e situações do dia-a-dia. Essa sensibilidade mental é criada através de uma harmonia interna e na medida em que esta harmonia e equilíbrio interno aumentam, as ondas e vibrações do ambiente exterior que não estão na mesma sintonia rapidamente se tornam mais harmônicas e equilibradas. Em outras palavras, as vibrações externas se harmonizam com as vibrações internas emanadas pelo praticante. Se alguém está zangado perto de você, rapidamente poderá perceber essa torrente de energia. Se você estiver na mesma sintonia, talvez não perceba, pois seus escudos psíquicos estão levantados. Se alguém estiver desanimado ou indisposto mentalmente, você perceberá porque estendeu seus poderes receptivos para o exterior. A sensibilização da consciência é o quarto aspecto do mantra-yoga. Com essa sensibilização da mente, internalizamos as faculdades da consciência para acessarmos o corpo psíquico, onde a energia é desperta com a ajuda do mantra.

É assim que mantra-yoga altera e reequilibra a personalidade mental. Agora, vamos tratar dos efeitos da prática em um nível psíquico.

Como mantra desperta a personalidade psíquica

Após as faculdades da consciência terem sido equilibradas e harmonizadas, a intensidade e sensibilidade da concentração que foi desenvolvida através das práticas iniciais, enquanto perpassa o corpo mental, se torna o meio de entrada no corpo psíquico. No corpo psíquico, a primeira consciência é do prāṇa e o uso do mantra intensifica essa consciência. Estamos sempre expressando nosso prāṇa de uma maneira ou de outra, dinâmica ou passivamente, externa ou internamente, mas nem sempre temos consciência desta expressão prânica.

Essa expressão prânica inconsciente pode causar desequilíbrios que são filtrados ao nível do corpo mental e se tornam a causa dos bloqueios prânicos. Estes bloqueios são experimentados na forma de falta de energia física, fadiga mental, letargia ou má vontade para fazer qualquer coisa, até mesmo pensar. Essa má vontade não é um processo consciente, é parte da atividade prânica filtrada para baixo no nível do corpo mental, o que resulta no sintoma da letargia etc. Portanto, bloqueios prânicos são o primeiro aspecto de desequilíbrios psíquicos que a prática de mantra ajuda a corrigir.

A experiência inicial de mantra-yoga traz paz e relaxamento. Este relaxamento não é letárgico, mas dinâmico. Neste estado, a estrutura prânica é reequilibrada. Após o reequilíbrio desta estrutura prânica, impressões visuais e mentais do corpo psíquico na forma de cakras, yantras e símbolos são criados a partir da concentração focada. Nós não despertamos nossos cakras, eles despertam a si mesmos devido à combinação de impressões visuais, a influência vibratória do mantra e a intensidade de concentração na imagem mental ou visual.

Tome como exemplo o ājñā-cakra. A meditação começa com um mantra e quando a consciência se sensibiliza, o ājñā é visualizado. No momento em que começamos a visualizar o yantra do ājñā-cakra, o direcionamento total da percepção e as faculdades da consciência são dirigidas imediatamente para aquele ponto no corpo psíquico. A impressão visual é um apoio, da mesma maneira que utilizamos binóculos para trazer objetos que estão longe para perto de nossa visão. Da mesma maneira, a impressão visual é utilizada como um auxílio para nos deixar conscientes da experiência psíquica. Mas apenas ver não ajudará. É harmonizando a visão com as vibrações do mantra que podemos sentir o estímulo dentro do cakra. Queimação na área do cakra, sensações particulares e a experiência do vórtice energético podem ser sentidas com maior facilidade. A cabeça flutua por outras dimensões. Portanto, mantra e intensidade de concentração operam juntos no corpo psíquico.

Com o relaxamento do prāṇa ocorre o estímulo ou o despertar das nāḍīs, dos cakras ou de alguma faculdade psíquica relacionada a um cakra. As faculdades de cada cakra começarão a se manifestar com maior facilidade se seus respectivos bīja-mantras forem utilizados. Por exemplo, se você utiliza o bīja-mantra yaṃ enquanto se concentra no anāhata-cakra, definitivamente começará a sentir algo na região deste cakra. Se você utiliza o bīja-mantra oṃ com concentração no ājñā-cakra, sentirá algo despertando naquela região. Contudo, se você utilizar o bīja-mantra laṃ do mūlādhāra-cakra tentando trabalhar o cakra viśuddhi, nada acontecerá. Você pode tentar, mas não haverá estímulo. Até mesmo a concentração – neste caso – não ocorrerá porque o mantra não se relaciona ao cakra. É como direcionar a visão para uma direção tentando ver o que tem na outra direção.

No corpo psíquico, as vibrações sonoras têm um papel importante. Elas dependem de como são repetidas, cantadas ou entoadas. Por exemplo, existe uma técnica meditativa onde se emprega a entoação do oṃ de diferentes maneiras. Na primeira entoação o oṃ é curto e acentuado, na segunda, ele é curto e suave, na terceira vez ele é de duração média e murmurante, na quarta entoação ele é longo e alto. A cada entoação um resultado ou experiência é produzido. Este é um aspecto muito importante do mantra.

A tradição do Yoga atesta que é possível despertar os cakras e a kuṇḍalinī somente através do mantra, sem ser submetido ao treinamento básico de haṭha ou pātañjala-yoga. A tradição atesta também que é possível atingir o samādhi seguindo o caminho direto do mantra apenas. Contudo, leva-se tempo para atingir o estado de intensidade requerida e são poucos os que a possuem para assumirem uma prática efetiva. Assim, com a finalidade de se construir essa intensidade e concentração, o praticante necessita passar por diferentes estágios de preparação. É por essa razão que não podemos nos envolver com mantras logo no início da jornada. Aqueles que tentaram sem passar pelos processos necessários de preparação falharam na prática do mantra-yoga.

Os mantras estimulam as energias que normalmente temos dificuldades para canalizar. Às vezes o mūlādhāra-cakra se torna tão ativo que é quase impossível controlar o sentimento de insegurança. Sob essas circunstâncias, uma pessoa pode ser lançada em uma profunda depressão. Os impulsos sexuais tornam-se difíceis de controlar. Não existe nenhum controle sobre a expressão dessa energia a não ser que exista um guru muito poderoso sentado ao lado. Portanto, não abuse das práticas e nem espere respostas imediatas com os mantras.

De acordo com a tradição, o mantra universal mais importante para despertar e entrar nos reinos do corpo psíquico é o ajapa-mantra sohaṃ alinhado conscientemente com a respiração. Três das maiores upaniṣads discutem a técnica ajapa-japa como o passo final antes da iluminação. As experiências com o corpo psíquico variam de uma pessoa para outra, de acordo com seu nível de evolução psíquica e mental e de acordo com os cakras que estão mais ativos na personalidade. Este é o conceito de mantra alterando a estrutura psíquica.

Como mantra é praticado

O processo de utilização do mantra chama-se japa-yoga ou a prática de repetição mântrica. Portanto, japa-yoga faz parte da ciência do mantra-yoga. Quatro estágios diferentes de repetição mântrica foram classificados: 1. baikharī, 2. upanśu ou madhyāma, 3. manasi ou paśyanti e 4. pāra.

1.    Baikharī ou repetição verbal é o estágio inicial de japa-yoga. Quando o mantra é pronunciado verbalmente, deve haver clareza de fala e entonação, concentração e consciência. A pronúncia correta é muito importante. Se há intensidade, concentração e clareza na prática, o mantra irá operar efetivamente e irá alterar a estrutura da mente (atitude e comportamento mental). Isso se aplica ao kīrtan também. Às vezes nós fazemos modificações nos kīrtans que estejam em concordância com a maneira que estamos mais acostumados a cantar. Portanto, preste atenção no que se segue.

Baikharī pode ser realizado de cinco maneiras diferentes, como se segue:

·         Repetição verbal e contínua em voz alta;
·         Repetição verbal conjugada com a respiração;
·         Repetição verbal conjugada com a mālā;
·         Repetição verbal conjugada com atividade física;
·         A prática de kīrtan, cantando e entoando mantras em diferentes tons ou rāgas.

No primeiro método existe a repetição verbal contínua em um tom estável desprovido de oscilações. Quando o mesmo mantra é cantado em coro, com diferentes tipos de entonação, ele se torna um kīrtan. O segundo método é a repetição verbal conjugada com a respiração. Nós não podemos repetir o mantra enquanto inspiramos, mas somente quando expiramos. Assim, a inspiração é normal e o mantra é entoado em voz alta enquanto se expira. O terceiro método é a repetição verbal conjugada com a mālā. Essa prática é similar ao primeiro método, à repetição verbal contínua, mas a consciência é fixada no movimento de cada conta, o que mantém a mente alerta e a atenção no mantra. O quarto método é a repetição mental conjugada com atividade física, que pode ser uma caminhada, o sentar-se pacificamente, trabalhar no jardim ou na cozinha, viajar etc.

2.    Upanśu ou madhyāma é o próximo estágio de japa-yoga. Upanśu significa som murmurante. Em baikhirī-japa a repetição do mantra pode ser executada em grupo ou solitariamente. Nestas duas situações o mantra é entoado em voz alta. Contudo, se existem pessoas presentes na hora da execução do mantra que não entendem o que você está fazendo ou que não têm a mesma disposição mental, então a entoação deve ser murmurante. O murmúrio auxilia a manter a consciência no mantra quando a mente se introverte, mas ainda existindo alguma atividade nela.

Upanśu-japa pode ser realizado de quatro maneiras diferentes, como se segue:

·         Repetição murmurante contínua;
·         Repetição murmurante conjugada com a respiração;
·         Repetição murmurante conjugada com a mālā;
·         Repetição murmurante conjugada com atividade física.

Neste estágio, não há canto em grupo ou kīrtan.

3.    Manasi ou paśyanti é o estágio da japa (repetição) mental. Manasi significa mental e paśyanti significa ver através dos olhos da mente. Manasi-japa pode ser realizado de cinco maneiras diferentes, como se segue:

·         Repetição mental contínua;
·         Repetição mental conjugada com a respiração;
·         Repetição mental conjugada com a mālā;
·         Repetição mental conjugada com a concentração em um símbolo;
·         Repetição mental conjugada com escrita psíquica no cidākāśa;
·         Repetição mental conjugada com atividade física.

Estes são os cinco métodos de manasi-japa. A repetição mental conjugada com a concentração em um símbolo, yantra, imagem de deidade ou do guru é algo claro para todos. A repetição mental conjugada com escrita psíquica no cidākāśa é raramente utilizada. Aqui não ocorre a visualização de símbolos ou yantras, mas a forma escrita do mantra, seja em caracteres latinos ou sânscrito, não importa. Neste processo você pode escrever, por exemplo, oṃ namaḥ śivāya no cidākāśa enquanto repete o mantra mentalmente na medida em que a visão se movimenta pelas letras que formam o mantra. A mente segue a repetição se concentrando nas letras escritas no cidākāśa.

4.    Pāra ou repetição transcendental é o último estágio de japa-yoga. Pratica-se pāra apenas de uma maneira: ajapa-japa (repetição contínua e espontânea ou sem esforço). Ela frequentemente ocorre quando interrompemos a repetição do mantra conscientemente. Em outras palavras, a repetição continua de forma involuntária na mente, permanecendo nela, vibrando todo o tempo. Isso ocorre quando o mantra energiza a mente pela sua repetição constante. Este estado não é atingido apenas por mantras, bījas etc., mas com kīrtan ou outra composição musical. A vibração continua na mente, sem nenhum tipo de esforço consciente ou controle mental por parte do praticante. A repetição torna-se como uma obsessão mental. Este é o aspecto do mantra conhecido como pāra-japa e nós o experienciamos de acordo com a sensibilidade e o envolvimento de nossa mente com o mantra. Estes são os quatro estágios de japa-yoga.

Regras para mantra-sādhanā

Japa-yoga auxilia com que a repetição mântrica se torne um processo meditativo. Portanto, um āsana apropriado deve ser selecionado e um tempo e hora devem ser fixados, seja na manhã, tarde ou à noite. Tente manter sempre o mesmo tempo e hora de início para sua prática de mantra. Se a hora que você fixou foi 6:00h em ponto, então deve se esforçar para manter essa disciplina todos os dias. Se algum dia você não conseguir, tudo bem, mas mantenha o esforço e a regularidade da prática.

Se não conseguir concluir toda a prática no tempo proposto ou se perder a regularidade, não se preocupe, você poderá compensar o tempo perdido em outro momento. A idéia por trás de se estabelecer um tempo fixo e regular é que nas vinte e quatro horas de atividade inconsciente, seja dormindo ou caminhando, deve existir uma hora fixa em que a mente possa ser sintonizada com o Ser Interior. Esse tempo fixo é seu tempo pessoal e não deve haver nenhum tipo de distração ou perturbação durante ele. Nas vinte e quatro horas de atividade, deve haver dez minutos, talvez quinze, meia ou uma hora todos os dias devotada ao seu processo de refinamento da consciência. Se um tempo é fixado, inicia-se o processo de educação mental.

Se está acostumado a comer às 19:00h todos os dias, quando essa hora vai chegando, você sempre começa a ter apetite. Se costuma deitar para dormir às 22:00h, quando essa hora chega, você começa a relaxar, sentir-se sonolento e rapidamente se dirige a cama. Quando a necessidade ou o desejo de comer ou de dormir se manifesta, você não precisa nem pensar nele. Deve ocorrer da mesma maneira com mantra-sādhanā. O objetivo é criar uma necessidade ou um desejo pela prática que ocorra espontaneamente na hora fixada, sem esforço consciente por sua parte.

Uma postura apropriada deve ser selecionada e sustentada durante a prática de maneira que não haja movimentos que distraiam a concentração. Não inicie japa logo que se sentar. Permita que o corpo e a mente se tornem estáveis e quietos. Uma vez que esteja confortável e o corpo e a mente estejam estabelecidos em um estado de tranqüilidade e estabilidade, então inicie sua prática de manasi-japa. Se você estiver utilizando um símbolo, se concentre e visualize-o primeiro. Quando ver o símbolo, comece o mantra. Não tente trazer o símbolo através do mantra. Se você está praticando com mālā, inicie a prática de mantra com ela.

É importante também fixar um número de voltas na mālā por dia, até que apareça um chamado interior para que aumente o número de voltas. Contudo, você não deve iniciar a prática com dez voltas na mālā e depois vir reduzindo este número gradualmente. Comece com uma volta na mālā e na medida em que seu envolvimento com a prática crescer, aumente mais uma volta. Com o tempo, três voltas... dez voltas.

Inicialmente, nós não temos controle sobre o estado de alerta da mente. Nós podemos nos tornar estáveis, mas não conseguimos manter o mesmo grau de vigília durante a prática. Na intensificação da concentração, se existe qualquer sonolência ou preguiça, mude a prática de manasi para upanśu-japa, a repetição murmurante do mantra. Como o murmúrio é uma atividade física, a mente se torna novamente consciente do processo físico e retoma o estado de alerta. Se, depois de algum tempo, devido ao processo de acomodação ou habituação da mente, ocorrer a internalização descontrolada da consciência através do sono, mude para baikhirī-japa: entoe o mantra em voz alta.

Dispersão é diferente de sonolência. Quando a mente se torna dispersa, você sabe que ela está fora de seu controle. Você não está inconsciente, portanto, deve ser capaz de retornar o estado mental e continuar sua prática. Neste momento você não precisa mudar de upanśu para baikhirī. Isso é feito somente quando você cai em um estado de inconsciência, onde perde completamente a consciência do mantra devido à profunda internalização sobre a qual não possui controle. Você pode controlar a dispersão mental em alguns minutos, mas não pode controlar as forças do inconsciente nestes mesmos minutos. Pelo contrário, ele se tornará mais intenso. Assim, no processo meditativo do mantra, nós começamos com manasi-japa e, dependendo do estado mental, vamos para upanśu ou baikhirī-japa.

A purificação mental é outro aspecto importante de japa-yoga. Inicialmente, a prática de mantra desencadeia um processo de afloramento do lixo mental. É o processo de limpeza ou purificação proporcionado pelo mantra antes do equilíbrio e estabilidade mental adquiridos pela prática. Os aspectos superficiais dos pensamentos, emoções ou desejos, que não são necessários na mente, mas que precisam ser expressados porque ganharam intensidade, ou saṃskāras vindos das profundezas da consciência na forma de desejos ou emoções, serão varridos pelo mantra. Na medida em que são eliminados, vê-se ver nuvens de desejos ou medos manifestados. Pode ser um desejo ardente por comida ou uma vontade intensa de dormir. Assim, o mantra vai de um lado ao outro da mente, purificando-a antes de equilibrá-la.

Este processo de purificação e reequilíbrio da mente não ocorre mais rapidamente aumentando o número de voltas na mālā ou intensificando mais as práticas. Seu curso normal de sādhanā deve ser seguido enquanto você pratica mantra por uma hora, três horas ou cinco minutos. Não é a repetição que importa, mas a consciência no ritmo e no processo da vibração. Não será fácil permanecer firmemente focado no mantra por toda prática. Existe um ressalto de dispersão natural na mente. Ela ficará para lá e para cá, seguirá seu curso natural.

Som psíquico, respiração psíquica e símbolo psíquico

Existem três importantes aspectos da meditação mântrica:

1.    Consciência contínua e ininterrupta do som psíquico ou mantra;
2.    A ligação do som psíquico com a respiração psíquica;
3.    A combinação do som psíquico com a respiração psíquica e a visualização do símbolo psíquico.

A consciência do som psíquico ou mantra é algo claro para nós. Contudo, nós temos de compreender o que significa conectar o som psíquico com a respiração psíquica. Consciência da respiração psíquica começa com a consciência da respiração física. Nós inspiramos e expiramos através das narinas, mas nós podemos experimentar a respiração em outras partes do corpo e por caminhos diferentes. Por exemplo, na prática de ajapa-japa (que abordaremos em breve), a respiração é vista dentro co canal psíquico que vai do umbigo até a garganta. Depois, ela é vista dentro deste mesmo canal psíquico, só que desta vez ele vai do umbigo ao ājñā-cakra. Em estágios mais avançados da prática, a respiração é vista no canal psíquico da espinha dorsal. Assim, o movimento da respiração que está sendo experienciada, imaginada ou visualizada em diferentes partes do corpo é a respiração psíquica.

O terceiro aspecto, a combinação do som psíquico com a respiração psíquica e a visualização do símbolo psíquico é um processo mais avançado. No início é quase impossível para qualquer um ver o símbolo psíquico. Portanto, é preciso imaginar o símbolo. Gradualmente, na medida em que a concentração se intensifica, o símbolo começa a tomar forma, muitas vezes como uma imagem sombria, depois o seu contorno, em seguida o símbolo em uma só cor e finalmente o símbolo completamente colorido. Quando essa imagem colorida do símbolo for vista espontaneamente, ocorre a visualização pura. Inicialmente ela começa com a imaginação e a repetição do mantra.

Estes três aspectos são absolutamente necessários. Se o mantra é repetido sem ser ajustado a respiração e sem consciência do símbolo, freqüentemente, devido a concentração e internalização intensa, o controle sobre o corpo é completamente perdido. Por exemplo, muitas vezes a mālā cai de sua mão sem que esteja dormindo, mas a consciência saiu do corpo e foi para outra dimensão. Quando sua mālā cai você se torna consciente de que seus dedos pararam de se movimentar e que ela está no chão. O chão é o último lugar em que sua mālā deveria estar. Isso ocorreu porque você perdeu controle ou consciência voluntária do corpo.

Mesmo nessa ausência de consciência existe um estado onde as faculdades da mente se esgotam por conta de sua dispersão mental. O exemplo do pássaro que voa sobre o oceano em busca de um local para repousar ilustra isso. Quando o pássaro vê um pedaço de madeira sobre as águas, ele pousa e descansa ali por algum tempo. Após ter descansado, o pássaro levanta vôo e continua sua jornada, mas se recordando do lugar onde descansou para que, se novamente precisar, voltar e descansar. Assim como o pássaro recorda de seu lugar de descanso, no processo de meditação profunda, onde pode ocorrer a internalização intensa da mente, deve haver uma base na qual podemos retornar, descansar e recuperar a consciência, o sentido de alerta e a vitalidade antes de voltarmos as dimensões sutis da mente.

O símbolo e a respiração atuam como uma plataforma. Eles formam a base na qual a mente é repetidamente trazida de volta para se restabelecer, para despertar e para afastar qualquer tipo de dispersão sutil que force sua estagia inconsciente nos recessos da mente. Após se restaurar e consolidar seu estado de consciência, a mente pode voltar a sua jornada pelo mantra com claridade mental.

Japa

Muitas pessoas estão ansiosas por alguma experiência meditativa genuína. Isso é compreensível, embora nenhuma pressa ou até mesmo aspiração tornará essa experiência possível, a não ser que a mente enganadora, tempestuosa e cheia de truques seja acalmada. A meditação é um processo espontâneo que ocorre somente quando a mente atingiu certa harmonia, equilíbrio e unidirecionamento. Isso se aplica – quer dizer, essa harmonia e calma na mente – tanto por tempos prolongados quanto por curtos períodos de tempo. Ela precisa ser harmonizada. Sem esse requisito prévio, a meditação não ocorre. Uma prática meditativa sistemática, segura e simples para adquirir essa harmonia na mente é a japa. É um método apropriado para qualquer pessoa, sem exceção.

A primeira preocupação para a maioria das pessoas deveria ser confrontar e exaurir os conflitos internos e desejos suprimidos. A prática de japa é um método excelente que vagarosamente extrai os aspectos negativos da parte subconsciente da mente, com pouca probabilidade de efeitos desagradáveis. A prática relaxa a arena pessoal da mente, o que possibilita a experiência natural da meditação. Japa é uma excelente técnica preparatória para os estágios avançados de kriyā-yoga, pois ela refina a mente, o que possibilita uma experiência mais profunda e verdadeira. Na verdade, japa integra muitas práticas do kriyā-yoga. Portanto, se você pratica japa, está alicerçando uma valiosa fundação para técnicas e estágios mais avançados na meditação.

A palavra sânscrita japa significa rotação, repetição. A prática é assim chamada porque ela envolve a rotação contínua da mālā e a repetição, também contínua, do mantra. Geralmente, executa-se japa por um período fixo de tempo e um número determinado de repetições. A entoação do mantra pode ser alta, baixa ou silenciosa. Japa também pode ser definida como entoação mântrica ritmada com a rotação da mālā e um fluxo contínuo de consciência. Para um benefício máximo, pratique com regularidade.

Um sistema universal

Japa é provavelmente o sistema de meditação mais universalmente difundido. É uma parte integral tanto do Yoga quanto do Tantra e do hinduísmo como um todo. Muitas escrituras tradicionais descrevem os métodos e os méritos da prática de japa, principalmente os textos tântricos que trazem imagens de yogīs ancestrais executando japa. De acordo com a tradição, Brahmā, Criador do Universo, deu início à criação de tudo o que existe através da prática contínua de japa com o mantra auṃ. Tal é a importância da japa na vida espiritual.

A prática de japa não se confina a Índia. Os budistas da escola Mahāyana utilizam uma mālā de 108 contas mais três extras que representam o refúgio em Buda, no Dharma e em Sangha. Os sistemas mais ortodoxos de cristianismo também executam japa. Qualquer pessoa que visitar um monastério católico romano notará que seus monges ou freiras fazem a rotação de seus rosários em suas práticas espirituais diárias. Qualquer pessoa que tenha visitado a Grécia ou outros países Bálcãs onde a Igreja Ortodoxa Grega é predominante notou que todos os homens carregam consigo um rosário. Seja lá o que eles façam, estão sempre circulando seus rosários, o máximo que podem, em todas as ocasiões. Eles praticam uma forma de japa todo dia.

Racional

Um genuíno estado de concentração é muito difícil de ser alcançado pela maioria das pessoas, pois os distúrbios internos e externos são muitos. Durante a prática meditativa podemos ser completamente subjugados pela torrente contínua do murmúrio mental interior, aborrecimentos, tristezas etc. e, por outro lado, nos encontramos incapazes de frear e impedir o alarde, inquietação e confusão exterior. Estas duas circunstâncias impedem a meditação. É claro, a inabilidade em se abstrair do alarde exterior é o fruto de uma desordem interna. Da mesma forma, se existe paz interior, o praticante pode automaticamente desligar-se das influências externas.

Outra cilada na prática meditativa é o sono. É muito fácil conquistar um estado profundo de relaxamento e como isso é raro, o praticante pode começar a entrar em um estado de sonolência e dormir. O relaxamento deve ser conquistado, como sempre estamos enfatizando, mas a consciência deve ser cultivada para que o praticante não caia no sono. Nós já discutimos essa questão do sono anteriormente, mas frisamos esse ponto repetidamente porque o sono é uma armadilha que engana a maioria das pessoas que empreendem a prática meditativa. Mas outra armadilha, em contra partida, é a concentração forçada. Muitas pessoas já compreenderam a importância da concentração, mas infelizmente tentam forçá-la, o que causa tensão, impedindo o verdadeiro estado da concentração (dhāraṇā). A concentração verdadeira naturalmente ocorre quando a mente está relaxada.

Nós temos um dilema aqui:

1.    O praticante não se preocupa em se concentrar. Isso normalmente leva a cilada mencionada acima, o sono, absorção nas interferências externas ou se esquecer de si mesmo enquanto se encanta pelo incessante murmúrio dos pensamentos.
2.    O praticante força a concentração no esforço de impedir o sono ou a tendência de perder ou esquecer de si mesmo enquanto se encanta pelo mundo externo ou pelos construtos de pensamento gerados pela mente. Isso geralmente leva a tensão mental.

Portanto, estas duas abordagens perante a prática da meditação estão incorretas e elas irão levar o praticante para bem longe dos resultados e benefícios reais da meditação. A resposta para este dilema, como já enfatizamos anteriormente, não é tentar se concentrar, mas permanecer consciente. Japa é um sistema maravilhoso para se manter a consciência individual. Além do mais, ela evita que o praticante se perca tanto nos acontecimentos externos quanto no mundo interno dos pensamentos, além de frustrar o sono, o torpor e a preguiça. Vamos ver como isso é conquistado.

Durante a prática de japa, o meditante tem de fazer duas coisas: entoar o mantra e circular a mālā. Isso atua como um ponto de referência para consciência. Após algum tempo de prática adquire-se ritmo, o movimento da mālā se sincroniza com a entoação do mantra. Ou seja, sua mente e corpo têm de fazer alguma coisa juntos. Isso evita as ciladas acima mencionadas da seguinte maneira:

1.    Sono: se você tende a cair no sono, a repetição do mantra e o movimento da mālā perderão o ritmo ou irão parar. Isso fará com que retome o estado de vigília. Nessa hora é bom se levantar e lavar o rosto com água fria. É claro, se cair em sono profundo, à quebra no ritmo não irá ajudá-lo. Você estará morto para o mundo. Provavelmente deve estar cansado e precise dormir. Não há mal nisso. Mas o ponto a ser frisado é que a quebra no ritmo do mantra e na rotação da mālā pode ajudá-lo a ficar consciente da sonolência para que possa ajustar sua situação na prática.
2.    Preocupação com o mundo externo: a rotação da mālā e a entoação do mantra rapidamente farão com que sua consciência se introverta. Isso ocorre com mais facilidade se a entoação do mantra for feita com sentimento (bhava) e intensidade (tapaḥ).
3.    Absorção no processo interno de cognição: não suprima seus pensamentos. Deixe que eles apareçam na superfície da mente, mas esteja completamente consciente deles. Não se perca nos pensamentos. Não se identifique com eles. Observe-os como uma testemunha. Japa é um excelente método que nos capacita a observar os pensamentos sem nos identificarmos com eles. O método segue: você deve, em um sentido, dividir sua consciência. Quer dizer, você deve estar simultaneamente atento ao contínuo fluxo de pensamentos, na rotação da mālā e na entoação do mantra. Deixe que os pensamentos surjam, mas mantenha-se consciente da prática de japa. Se você começar a se perder em seus pensamentos, interrompa a rotação da mālā, pois a entoação do mantra e a rotação da mālā se tornarão descoordenados. Seja lá o que aconteça, você perceberá a perda de consciência na japa e rapidamente poderá equilibrar a divisão da consciência. Você precisa continuar neste processo, o tempo todo.

Eventualmente, se a prática estiver sendo executada corretamente por um período prolongado de tempo, o contínuo fluxo de pensamentos diminuirá e rapidamente irá se exaurir espontaneamente, por si mesmo. O tumulto mental irá se acalmar. A mente é carregada, magnetizada e imantada pela repetição do mantra, ao invés de se envolver com os construtos de pensamento. Portanto, a mente rapidamente se acalma e se torna unidirecionada. A consciência se reveste do mantra e isso é exatamente o que queremos. Neste estado a mente se torna relaxada, não pela supressão, mas pela exaustão dos pensamentos que se precipitam na superfície da mente e a gradual tendência de se perder nos devaneios do processo cognitivo. O estado natural de mente relaxada sem o tumulto intenso dos pensamentos é um prelúdio a meditação profunda.

Contudo, o contínuo borbulhar de pensamentos na superfície da mente é um processo positivo, especialmente quando eles vêm dos profundos reinos da mente subconsciente. Estes são os seus problemas internos. É observando-os que você poderá removê-los. Infelizmente, os pensamentos que seduzem a maioria das pessoas durante a prática meditativa são, muitas vezes, superficiais. Estes devem ser removidos pela prática de japa para que você possa ver profundamente. Assim, a japa atua sistematicamente limpando a mente destes pensamentos superficiais que são mera distração.

Quando sua mente se tornar unidirecionada e você estiver profundamente absorvido no mantra, subitamente poderá se confrontar com visões ou pensamentos que surgem inesperadamente. Estes representam seus problemas mais profundos que precisam ser removidos. A mera consciência deles irá fazer isso. Neste estágio, quando você estiver explorando as camadas abaixo da superfície mental, é à hora de iniciar a purificação destes problemas enraizados nos rincões inacessíveis da mente.

4.    Concentração: isso ocorrerá automaticamente na medida em que continuar bombardeando o contínuo fluxo de pensamentos através da japa. Quer dizer, consciência leva a concentração da mente. Quando exaurir os pensamentos deruptivos da mente, não terá alternativa senão se concentrar. Em ou-

tras palavras, será quase que forçado a se concentrar.

Japa é um método simples e efetivo de superar todas as armadilhas que mencionamos anteriormente. É por isso que é amplamente praticado. Ele provê um equilíbrio entre a absorção no mundo externo e seu oposto, a perda total no mundo dos pensamentos. Auxilia a cultivar a consciência através da concentração e vice versa. Acalma o murmúrio da mente, não pela supressão, mas permitindo que os pensamentos surjam enquanto se ancora a consciência no mantra e na rotação da mālā. É útil principalmente para pessoas que não conseguem se concentrar.

Qual o mantra utilizar

Existem inúmeros mantras. Os mais comuns são: auṃ, krīṃ, hrīṃ, śrīṃ, aiṃ, dūṃ, hūṃ, auṃ namaḥ śivāya, rāma, kṛṣṇa, durgā, auṃ mani padme hūṃ e muitos outros. O som ou padrão vibratório do mantra estimulará certos efeitos na natureza mental e psíquica de cada praticante. Cada mantra irá criar ou evocar um símbolo específico na psique.

Idealmente, o mantra deveria ser recebido diretamente do guru ou uma pessoa de consciência elevada, como se diz no Kulārṇava-tantra (XV: 19): Somente o mantra recebido pelo guru irá realizar seu poder.

Se você recebeu o mantra através da iniciação, continue sua prática de japa. Não mude o mantra, exceto por uma boa razão. O que se segue são as razões pelas quais você deveria mudar seu mantra:

1.    Seu guru lhe deu outro mantra;
2.    Atingindo um elevado estado de consciência você recebeu outro mantra que carrega sua mente de tal maneira que não tem dúvida de que aquele é seu mantra. Isso às vezes acontece e neste caso você deveria mudar o mantra;
3.    Você recebeu o mantra em um sonho. Neste caso, você deveria consultar seu guru para a análise do mantra e se ele é conveniente realmente para você na atual fase de sua vida. É muito fácil se auto-sugestionar em um sonho e receber um mantra. Definitivamente, este não é um mantra correto.

Se você não recebeu um mantra pessoal de um guru ou se você não o recebeu em um insight, é melhor que use o auṃ ou qualquer um dos acima citados para finalidades específicas. Não revele seu mantra a ninguém, mesmo que seja o auṃ.

Anuṣṭhana-sādhanā

A palavra sânscrita anuṣṭhana significa voto de execução ou execução de um ato específico. Anuṣṭhana-sādhanā ou anuṣṭhana-japa é um método largamente utilizado. Nesta prática, o meditante se propõe a executar japa por um período fixo de tempo ou um número específico de repetições do mantra. O propósito é disciplinar o praticante e ao mesmo tempo imantar sua psique para que ele realize o que deseja com a prática. Muitas pessoas começam um projeto com intensidade e bastante interesse, mas infelizmente, com o tempo, se cansam e desistem. Elas falham em conquistar seu objetivo. Isso ocorre com a japa também. O entusiasmo desaparece e o meditante não continua a execução de sua prática. Portanto, este voto auxilia na superação desta tendência letárgica.

Este sādhanā é muito comum na Índia e é usualmente prescrito para pessoas cuja mente é fraca. A prática pode ser executada em um dia, uma semana, um mês, um ano ou o tempo necessário para finalizar (ou realizar) o objetivo da prática. A duração, contudo, deve ser realista. Deve haver sinceridade neste ponto. Tradicionalmente, anuṣṭhana é associada a algumas regras:

1.    Silêncio total ou pelo menos a redução do hábito de se falar em demasia;
2.    Corte total do contato com a família, amigos e responsabilidades;
3.    Restrições na dieta.

Existem inúmeras outras regras, mas são impossíveis de serem praticadas por pessoas de mente comum ou ocupadas com os trabalhos do dia-a-dia.

Se você deseja executar anuṣṭhana-sādhanā seriamente, sugerimos que busque os conselhos de um professor competente em um nível pessoal para que ele possa prescrever as regras mais adequadas a sua natureza e circunstâncias. De qualquer maneira, o que aconselhamos é que primeiro o praticante assuma o voto de meditar e praticar Yoga todos os dias, por uma, duas ou três horas e praticar karma-yoga por todo o dia. Esta não é uma anuṣṭhana árdua, mas irá assegurar que você pratique todos os dias.

No que concerne a prática de japa, você pode formular uma resolução que irá entoar seu mantra um certo número de vezes por um período de tempo. Por exemplo, você pode entoar 100,000 vezes o mantra auṃ no período de 50 dias. Para executar esta anuṣṭhana, o mantra deve ser entoado 2000 vezes todos os dias. Se você entoa um auṃ por segundo, entoará 60 vezes a cada minuto. Portanto, o tempo requerido para entoar 2000 vezes é a divisão de 2000/60, que dará 35 minutos diários. Isso, é claro, dependerá sempre do tamanho do mantra. Você pode assumir também o voto de entoar o mantra 1080 vezes em dez dias, o que dará 10 rotações na mālā de 108 contas, uma por dia. Outra possibilidade é entoar 50,000 vezes, praticando uma hora por dia, pelo tempo requerido para finalizar o voto. Existem muitas possibilidades e combinações. Você deve escolher o método mais apropriado para a fase em que se encontra.

Anuṣṭhana-japa é um excelente método para acalmar e purificar a mente. Sempre recomendamos anuṣṭhana em combinação com japa, embora isso não seja absolutamente essencial. Se você não quer se submeter a um voto, pode então continuar a praticar japa todos os dias. Isso, é claro, trará muitos benefícios.

Posição para prática de japa

Qualquer postura meditativa confortável pode ser utilizada para prática de japa. Tradicionalmente, você deveria ficar de frente para o norte ou leste.

Variações de japa

Existem inúmeras variações de japa. Não pretendemos abordar todas, mas somente aquelas que acreditamos serem úteis e efetivas. Os métodos precisam de pouca explicação, pois são muito simples, uma vez que já descrevemos ao longo do capítulo muitos detalhes essenciais.

Japa: estágio 1

Método 1: vak-śuddhi
Assuma uma postura confortável.
Mantenha a coluna e a cabeça eretas, mas sem esforço.
Esteja consciente de seu corpo. Sinta como estável e relaxado ele está.
Não se apresse.
Imagine que é livre de preocupações ou que pelo menos elas não irão lhe incomodar enquanto executa a prática.
Inicie a repetição do mantra e a rotação da mālā. Comece pela conta após o sumeru.
Movimente cada conta sincronizadamente com a entoação do mantra.
Esteja consciente do mantra e da rotação da mālā simultaneamente enquanto observa os pensamentos na medida em que eles aparecem.
Não rejeite qualquer pensamento; deixe que os pensamentos surjam na superfície da mente, mas esteja consciente deles.
Tudo o que você precisa fazer é observar o processo da mente enquanto mantém a prática de japa: consciência total na repetição do mantra, na rotação da mālā e nos pensamentos que surgem na superfície da mente (pausa).
O mesmo se aplica aos distúrbios externos: esteja consciente deles, mas mantenha o foco no mantra e na rotação da mālā.
Continue até atingir o sumeru novamente. Não cruze o sumeru. Apenas gire a posição da mālā e reinicie a rotação, conta por conta (pausa).
Muitas idéias ou distrações irão surgir na superfície da mente; deixe-as, pois esta é a natureza tempestuosa da mente. Permaneça como uma testemunha deste processo. Após algum tempo, estes pensamentos irão diminuir e sua concentração irá aumentar. Se continuar neste processo, então visões profundas poderão aparecer. Esteja consciente delas. Deixe que surjam. Apenas observe (pausa).
Após a finalização da rotação da mālā e da entoação do mantra, observe o cidākāśa por alguns minutos.

Método 2: japa e pulso

Existem inúmeras maneiras diferentes de se praticar este método. O que aqui selecionamos deve ser executado mentalmente (manasi-japa) da mesma maneira que anteriormente, exceto que o mantra e a rotação da mālā deverão estar sincronizados com o pulso ou as batidas do coração.

Os lugares mais fáceis de sentir o pulso são:

1.    O centro entre as sobrancelhas
2.    O coração
3.    A garganta
4.    O umbigo

Você pode escolher qualquer outro lugar, mas deve ser onde sinta claramente o pulso ou as batidas do coração.

Nos recomendamos especialmente a consciência do pulso com manasi-japa após baikharī-japa. Isso intensifica a sensação do pulso. Para este método, aconselhamos ainda a consciência no centro entre as sobrancelhas (tṛkuti-japa).

Consciência

Como enfaticamente advertido, a consciência deve repousar na repetição do mantra, na rotação da mālā e nas atividades da mente. Esteja consciente do pulso se estiver praticando o método 2.

Quando e onde praticar

Você pode praticar japa a qualquer momento e em qualquer lugar. Contudo, a fim de disciplinar a mente, é melhor praticar regularmente todos os dias, sempre na mesma hora. Os melhores horários são logo pela manhã, assim que acordar ou à noite, antes de dormir.

Japa também pode ser executada como uma prática preparatória para outras técnicas meditativas. Isso irá acalmar a mente para que você possa ganhar o máximo de benefício na meditação.

Benefícios

Japa garante os mesmos benefícios de outras técnicas meditativas. Ela acalma a mente turbulenta e auxilia o praticante a expelir complexos, neuroses, fobias etc. A prática tem o poder de fazer isso sem desequilibrar a vida. Japa carrega a mente com positivas vibrações sonoras. Isso é uma terapia maravilhosa para pessoas cuja mente se encontra em um estado de tumulto e desequilíbrio. Japa provoca o unidirecionamento da mente sem forçar a concentração. Sua prática promove o despertar de incríveis faculdades latentes inerentes a todos nós. Finalmente, japa pode lhe levar aos estágios mais profundos de meditação.

Regras gerais e sugestões

A fim de deixar a prática mais clara, vamos sumarizar os pontos básicos que discutimos:

·         Use o mantra dado por seu guru. Se não possui um mantra pessoal, utilize um mantra universal.
·         Gire a mālā com o dedo médio, segurando cada conta com o polegar e dedo anular. Sempre use a mão direita, mesmo que seja canhoto.
·         Não cruze o sumeru após finalizar a rotação da mālā. Gire ou reverta a mālā e continue da conta que parou.
·         Relaxe a mente e o corpo, mas não durma.
·         Não force a concentração. Mas esteja consciente. Na concentração você introverte sua atenção que antes estava em todas as direções a um único ponto. Utilizando a consciência, você não irá se focar apenas no ponto de concentração, mas também nos pensamentos que surgem na superfície da mente. Não lute contra a mente, mas dome-a mantendo-se como uma testemunha de todas as suas atividades.
·         Se necessário, alterne sua prática entre baikharī, upanśu e manasi-japa. Se a mente está perturbada, mantenha-se em baikharī; se a mente estiver calma, mantenha-se em manasi. Se a mente começa a vaguear enquanto pratica manasi, retorne a baikharī.
·         Entoe o mantra de forma clara e rítmica. Se a mente começa a vaguear, aumente a velocidade.
·         Não revele seu mantra a ninguém.
·         Tente praticar japa com regularidade. Será melhor se combinar sua prática com anuṣṭhana.
·         Reflita sobre o significado do mantra sempre que possível.


Na medida em que a mente subconsciente é progressivamente purificada e o praticante avança nas práticas meditativas, gradativamente ele se confronta com a enormidade de sua psique e uma quantidade esmagadora de visões, premonições sobre o futuro e muitas outras experiências. Uma vez que é essencial observar as inúmeras manifestações que ocorrem na psique como uma testemunha, o praticante não deve se envolver, não deve se encantar ou se deixar oprimir por elas. Observe-as de todas as maneiras, mas não se distraia na medida em que se aprofunda nas camadas mais inacessíveis de sua mente. É possível ir mais fundo, muito mais fundo do que a imaginação pode conceber.

Não se apegue ao exterior. Observe, experiencie, permaneça sempre como uma testemunha. Seja desapegado... seja consciente. Essa é a maneira de não se deixar seduzir ou se distrair na medida em que mergulha nas profundezas de si mesmo. Pode ser que neste momento você não esteja explorando os níveis mais profundos de sua psique, mas com força de vontade e continuidade de propósito, logo estará. Fazemos essa advertência para que você tenha isso em mente quando iniciar suas investigações nos incríveis reinos da psique que se encontram além do subconsciente. Não se prenda ao cenário agradável – ele é muito bonito mesmo – na medida em que caminha em direção ao centro de seu Ser. Sempre se lembre que o objetivo é explorar e experienciar a essência de seu Ser. Portanto, não se perca.

Reflexão

A prática de japa pode trazer benefícios maravilhosos se você reflete sobre o significado do mantra. Isso pode ser feito durante a prática ou através do dia. Mas a necessidade de se conhecer o verdadeiro significado do mantra precisa vir do coração. A prática não trará resultados se a necessidade não vir do interior. Cada mantra possui inúmeras camadas de vibração que precisam ser exploradas. Você precisa se fundir com o mantra e experienciar tudo o que ele evoca. Cada mantra representa algo que não pode ser explicado em simples palavras. É preciso vivenciar o mantra. É por isso que no início nós não aconselhamos as pessoas a se apegarem ao significado do mantra. Quando explicamos o significado do mantra para os iniciantes sua prática pode se tornar superficial, pois o intelecto irá atuar em demasia na prática. Na verdade, você precisa descobrir o significado do mantra por si mesmo, pois nenhuma pessoa jamais poderá explicar o significado de um mantra para outra pessoa sem ferir sua grandeza e profundidade. A explicação jamais transcenderá o abismo que existe entre o significado verbal e a experiência direta.

O processo de reflexão no significado do mantra intensifica japa-sādhanā. Mas isso é para os praticantes mais experientes que desenvolveram o poder de penetração e inquirição da mente. Essas qualidades se apresentam nos praticantes que possuem uma mente calma e unidirecionada. Portanto, não se sinta obrigado a refletir sobre o significado do mantra durante a prática de japa. Japa lhe proverá resultados maravilhosos sem essa reflexão, mas ela leva aos frutos mais elevados de japa-sādhanā.

Devoção

A devoção é outro método poderoso para se intensificar a prática de japa. Ela deve ser praticada pelas pessoas naturalmente inclinadas a adoração, pessoas que possuem um notável caráter emocional.

Cada mantra é uma śakti, uma conexão direta com o divino. Portanto, quando entoar seu mantra, sinta que está comungando com a essência divina. Sinta amor em seu coração e ao mesmo tempo esteja consciente de todas as associações que envolvem o mantra. Deixe que esse sentimento interior de completude (bhava) preencha todo seu Ser. Eventualmente seu coração entoará o mantra espontaneamente. Isso intensificará todo processo de japa.

Japa-sahita-dhyāna

A palavra sânscrita sahita significa junto com ou combinado com. A palavra dhyāna significa meditação. Portanto, essa prática é a combinação de japa com consciência do símbolo interno (antar-trāṭaka).

Se você entoa o mantra auṃ pode utilizar seu símbolo correspondente como foco para sua atenção. Se você possui um mantra pessoal e conhece seu símbolo, use-o, caso contrário, escolha qualquer outro símbolo que possua conexão com seu mantra. Se possui um iṣtā-devatā (deidade particular escolhida para adoração), pode usar sua imagem (trāṭaka). Mas se não chegou neste nível de desenvolvimento, procure as instruções de um professor qualificado.

Incidentemente, cada mantra está inseparavelmente associado a um símbolo ou forma definida. Portanto, se sua mente atinge um profundo estado de relaxamento, unidirecionamento e receptividade, e se ela estiver completamente preenchida e energizada pela vibração sonora do mantra, o símbolo psíquico que possui conexão direta com o mantra irá surgir espontaneamente na percepção consciente. Indo neste caminho, você encontrará a forma exata ou o símbolo de seu mantra.

O método é basicamente o mesmo que descrevemos na lição anterior, mas você deve visualizar o símbolo escolhido na frente de seus olhos fechados. Se for inclinado a adoração, pode praticar a devoção, conectando o mantra a deidade particular ou pode refletir sobre o significado do símbolo e do mantra.

Se a sua mente não está direcionada será muito difícil visualizar uma imagem clara. Portanto, nós primeiro recomendamos que você acalme a sua mente e remova os construtos de pensamento que a distraem praticando os métodos 1 e 2 descritos acima. Quando a mente se tornar concentrada, então pratique japa-sahita-dhyāna. Esta é uma prática mais difícil, mas é também mais poderosa. Sua consciência deve fluir junto com o mantra, o símbolo e a rotação da mālā. Se você encontra dificuldade em manter uma imagem interior fixa, pratique os métodos apresentados no módulo anterior.

Likhit-japa

A palavra likhit significa escrever. Portanto essa prática pode ser chamada de japa ou repetição escrita. Ela envolve a escrita da forma do mantra inúmeras vezes em um diário. Por exemplo, você pode escrever o símbolo do auṃ: \\\\\\\. Mas pode também escolher o símbolo que achar necessário.

As letras devem ser pequenas e bem claras. Isso aumentará a concentração. Escreva cada símbolo com o máximo de cuidado, proporção e senso de beleza. Faça com que cada símbolo seja uma obra de arte, pelo menos para você.

Na medida em que escrever cada mantra, o entoe mentalmente. Isso pode não parecer uma prática meditativa, todavia ela é. Se você escreve páginas e páginas de símbolos e simultaneamente entoa seus respectivos mantras, estará induzindo o equilíbrio e o unidirecionamento da mente. Se você associar a escrita com a devoção e | ou a reflexão no seu significado, a prática será potencializada. Essa é uma técnica muito difundida na Índia. Durante o mês de śravana, os hindus tradicionalmente colhem inúmeras folhas de uma árvore chamada bilva. O mantra Auṃ Namaḥ Śivāya é escrito nas folhas com pó vermelho e elas são oferecidas ao Senhor Śiva. Essa prática é executada durante todo o mês e gera grande devoção.

Este é o tipo de técnica que pode ser executada aos domingos à tarde, ao invés de se ler um jornal ou dormir.

Sumirani-japa

Este é um tipo de japa para ser executada durante todo o dia. É geralmente feita com uma mālā de 27 contas, levada pelo praticante a todos os lugares, em todas as ocasiões. No Ocidente isso não é nada prático, mas este é o método tradicional. Para pessoas que empreendem um sādhanā durante todo o tempo, essa é uma pratica efetuada continuamente. Quer dizer, seja qual for à circunstância, a mālā é circulada e o mantra é mentalmente entoado. Com proficiência, essa prática continua até durante o sono. O objetivo é fazer com que o mantra eventualmente surja dos rincões mais profundos de seu Ser. Neste ponto, você não precisará entoar o mantra, ele estará sendo entoado o tempo todo espontaneamente. Todo seu Ser irá ressoar com o mantra. A mālā irá girar por si mesma. Isso transformará a mente em um veículo incrivelmente unidirecionado e poderoso, o que trará frutos bem-sucedidos a prática espiritual na medida em que induz o estado meditativo profundo. É um método poderoso, mas não é nada prático a pessoa de mente comum. É difícil fazer rotações na mālā enquanto se conversa com o patrão, enquanto dirige um carro etc., mas é uma prática que você pode tentar em um feriado, quando estiver caminhando ou nas horas vagas. Se você entoa seu mantra regularmente durante as horas de folga, eventualmente o mantra se manifestará automaticamente quando estiver executando suas tarefas. Ele continuará sendo entoado no plano de fundo de todas as suas ações. Esta é uma técnica poderosa que pode levá-lo a experiências elevadas.

Ajapa-japa

Essa é a repetição (japa) que ocorre espontaneamente (ajapa) em harmonia com os ritmos naturais do complexo corpo-mente. Nós lhe introduziremos ao tema na próxima lição deste módulo.

Nota geral

Japa só se tornará poderosa na medida em que for praticada com regularidade e sem falha.

Mālā

A mālā é um cordão de pequenas contas separadas umas das outras por um tipo especial de nó chamado brahma-granthi ou nó da criação. As contas são delicadamente distribuídas ao longo de um forte filamento de linha e são em número de 108, mas existem mālās de 54, 27 e 11 contas para sādhanās (práticas espirituais) específicas.

Cada mālā tem uma conta extra, adjacente ao ilhó final. Ela é chamada de sumeru (junção ou cume de conta) e serve como um ponto de referência para o praticante saber quando terminou a rotação completa na mālā. A mālā é parte essencial das principais técnicas de japa-yoga. Ela é um instrumento para se manter a consciência.

Mālās são comumente feitas de sementes de tulsi, sândalo, rudrākṣa ou pequenos cristais. A mālā feita de tulsi é a mais comumente usada para japa. Tulsi é uma planta sagrada e largamente venerada que contém muitas propriedades curativas e auxilia no desenvolvimento de faculdades psíquicas. Ela tem um forte efeito purificante sobre as emoções e acalma a mente. Os devotos de Viṣṇu utilizam esta mālā pois tulsi é considerada como uma encarnação de Lakṣmī, esposa de Viṣṇu. Mālās de sândalo são suavemente perfumadas e possuem vibrações de proteção e também acalmam a mente. Elas contêm propriedades refrescantes e são ótimas para pessoas que possuem problemas na pele. Rudrākṣa é a semente da fruta de uma árvore nativa consagrada a Śiva que só nasce em mata fechada. A mālā de rudrākṣa é considerada a mais poderosa e efetiva para a prática de japa e é utilizada pelos devotos de Śiva. Rudrākṣa influencia magneticamente a circulação sanguínea, fortalece o coração e é recomendada as pessoas que sofrem de pressão alta. As mālās de cristal possuem propriedades psíquicas e são utilizadas por aqueles que adoram Devī.

Mālās não são utilizadas apenas por adeptos tântricos e yogīs. Os praticantes do Budismo Mahāyana também utilizam mālās de 108 contas em suas meditações. Entretanto, suas mālās contém três contas extras representando o refúgio em Buda, Dharma (deveres, código de convivência, caminho espiritual) e Sangha (ordem de monges budistas). Os católicos romanos utilizam um rosário de 54 contas. Na Grécia e outros países dos Bálcãs onde a Igreja Ortodoxa Grega é predominante, todos os homens carregam um rosário onde quer que vão e circulam as contas o máximo que podem. Sem seus rosários, eles se sentem nus. A razão pela qual eles circulam as contas do rosário o tempo todo, em todas as atividades, é para manter o fluxo da consciência no que estiverem fazendo, mantendo a mente focada na atividade.

O propósito da mālā

Muitas pessoas têm curiosidade sobre o porquê da mālā ser usada na prática de meditação com japa e se têm de usar uma e como manuseá-la. Antes vamos falar do propósito da mālā. Por conta de sua natureza, a mente não permanece estável por um longo período de tempo. Portanto, faz-se necessário um mediador ou uma base de auxílio pela qual podemos saber se estamos conscientes ou não. Utilizamos a mālā como um mecanismo pelo qual podemos acordar daqueles momentos onde perdemos a consciência e nos esquecemos daquilo que estamos fazendo. Também utilizamos a mālā para verificar o andamento da prática e sua qualidade.

Inicia-se a prática de japa a partir da conta sumeru e segue-se girando a mālā ritmicamente, conta por conta. A mālā desliza em um fluxo contínuo até ser interrompida novamente pelo sumeru.
A partir de determinado estágio de japa, quando a mente se torna calma e serena, é possível que os dedos fiquem inertes. Eles ficam momentaneamente paralisados enquanto você permanece completamente inconsciente do processo. Às vezes a mālā pode cair no chão. Quando essas coisas ocorrerem, saiba que se distanciou do objetivo de japa, quer dizer, você falhou em manter o fluxo da consciência. Se não está com a mālā na mão enquanto pratica japa, como saberá o que está experimentando. É a continuidade de foco na mālā que irá demonstrar seu estado de consciência. Se estiver focado na mālā e nos dedos a cada conta, então estará consciente. Quando japa for executada corretamente e a concentração ocorrer, a mālā continuará a se movimentar quase que automaticamente, mas de forma consciente.

A mālā pode ser algo que seu intelecto não aceita, mas para que haja sucesso na prática de japa, a mente necessita de uma ferramenta.

O fato da mālā ter 108 contas precisa de uma explicação. Existem inúmeras teorias nas escrituras sobre este ponto. Vamos ver alguma coisa. 1 representa a consciência suprema; 8 representa os oito aspectos da natureza, consistindo dos cinco elementos fundamentais (terra, água, fogo, ar e éter), mais ahaṃkāra (princípio de egoidade), manas (mente) e buddhi (sentido de percepção intuitiva); 0 representa o cosmos, todo o campo da criação. De outra maneira: 0 é Śiva; 8 é Śakti e 1 é sua união (yoga).

Alguns acadêmicos acreditam que 108 representa o número de crânios na guirlanda que adorna Kālī, venerada como a Grande Mãe e a Senhora da Realização yogī, mas por muitos é considerada a deusa da destruição. É dito também que 108 é o número de encarnações do jīva (a alma ou consciência individual) antes da realização espiritual

Existem explicações similares para os números 27, 54, 57, 1001 etc., todos usados em mālās. Mas estes números possuem profundos significados psíquicos. São números escolhidos que auxiliam a experiência de estados de consciência auspiciosos enquanto se pratica japa. Eles foram recebidos pelos antigos videntes (ṛṣīs) e são apropriados para experiências psíquicas. A explicação destes números serve apenas aqueles que procuram uma abordagem mais intelectual da prática.

Além das 108 contas da mālā, existe ainda o sumeru, a conta extra que representa o topo da passagem psíquica conhecida como suṣumnā-nāḍī. Por esta razão o sumeru ou meru é às vezes chamado de biṅdu. As 108 contas representam os 108 centros, estações ou campos através dos quais sua consciência viaja até o biṅdu e retorna. Estes centros são cakras menores e eles representam o progressivo despertar da mente. O biṅdu é o limite desta expansão mental.

Como usar a mālā

Existe um método especial de segurar a mālā. Ela deve ser manuseada com a mão direita, suportada péla ponta do polegar unida ao dedo anular. O polegar não é utilizado para girar a mālā e os outros dedos (indicador e mindinho) não devem tocar na mālā. O dedo médio movimenta as contas.

Quando utilizar a mālā, não cruze o biṅdu. Inicie a prática a partir da conta imediatamente posterior ao biṅdu e quando terminar o rotação total, finalize na conta imediatamente anterior ao biṅdu. Neste ponto, vire a mālā e continue a prática. Sempre gire a mālā sobre ou na direção da palma da mão.

Tradicionalmente, japa é praticada enquanto se mantém a mão direita na frente do peito. Desta maneira o mantra pode ser entoado em sincronia com as batidas do coração. Manter a mão na frente do peito intensifica o sentimento de entrega e concentração no mantra. A mão esquerda deverá estar sobre o colo em cin, jñāna ou cinmaya-mudrā. A mão esquerda também pode segurar a mālā, evitando que ela oscile ou se enrole, prejudicando a concentração na passagem das contas pelos dedos. Se preferir, a mão direita pode ser colocada sobre o joelho direito. Neste caso a mālā descansa no chão.

Pode-se contar o número de rotações na mālā mentalmente ou utilizando a mão esquerda como se segue: após uma rotação na mālā, coloque a ponta do polegar esquerdo na linha da primeira junta na base do dedo mindinho. Após a segunda rotação, escorregue a ponta do polegar para a linha da segunda junta. Após a terceira rotação, escorregue a ponta do polegar para última linha da junta do dedo mindinho. Seguindo, após a quarta rotação, leve a ponta do polegar esquerdo na linha da primeira junta na base do dedo anular esquerdo e assim por diante. Desta maneira você contará doze rotações na mālā.

A mālā utilizada para prática de japa não deve ser usada ao redor do pescoço. Quando não estiver sendo utilizada, deve ser mantida em segredo, guardada em um pequeno saquinho de pano ou envolta em um pano especialmente consagrado para guardá-la. Isso evita qualquer mudança ou influência negativa de vibrações sobre a mālā. Nunca empreste sua mālā para outras pessoas. Seja quem for à pessoa, ele nunca deve tocar ou ver a mālā com que executa suas práticas meditativas. Mālās utilizadas para decoração não são apropriadas para uma prática séria de japa.

Uma mālā usada diariamente se tornará, com o tempo, impregnada com vibrações positivas. Após alguns meses, no momento em que tocar a mālā, irá se tranqüilizar e terá quietude e estabilidade na mente.

Se você pratica japa-mālā muitas vezes por dia, poderá ficar com os braços cansados se estiver com a mão na frente do peito. Neste caso, você pode usar um suporte (eslinga) para o braço.

O uso da gomukhi

Se você executa longas práticas de japa durante o dia, o uso da gomukhi é recomendado. A palavra gomukhi significa na forma da boca da vaca. É um pequeno saquinho que se assemelha a boca de uma vaca. A mālā e a mão direita são colocadas dentro da gomukhi para que estejam longe da visão de outras pessoas. A gomukhi pode ser utilizada enquanto se caminha ou a qualquer momento, mas é particularmente útil para aqueles que estão engajados em anusthana-sādhanā (prática de japa por um período fixo prolongado). Na verdade, para estas pessoas, o uso da gomukhi é essencial.

A mālā muitas vezes pode não ser aceita facilmente pelas pessoas ocidentais em um nível intelectual, mas sem que estejam conscientes disso, elas têm aceitado a mālā intuitivamente. Já passou pela sua cabeça de onde vem essa moda de utilizar colares de pérola ou outras pedras e adornos decorativos? Nas culturas arcaicas, contas (mālās), anéis e amuletos eram utilizados para finalidades espirituais e desde aqueles tempos, as pessoas têm sido atraídas por esses adornos. Nos dias de hoje, em nome da moda, homens e mulheres utilizam esses adornos com finalidades puramente estéticas.

Mantramālā

Todo aspirante espiritual deveria praticar mantra-sādhanā no início de cada dia. Mahāmṛtyuñjaya-mantra, gāyatrī-mantra e durgā-mantra são três mantras auspiciosos para serem entoados todas as manhãs, antes mesmo de sair da cama e se envolver na rotina diária. Por que? Quando dormimos, a mente se torna tranquila e passiva, como a superfície de um lago, imperturbável por qualquer agitação ou movimento. Quando acordamos pela manhã, a mente está relaxada, os sentidos estão em paz e não há nenhuma distração mental, emocional ou intelectual. Portanto, a primeira impressão que a mente deve receber pela manhã é o mantra.

Se lermos notícias nos jornais, escutarmos rádio ou assistirmos TV como primeira atitude pela manhã, nos impregnamos de impressões acerca de escândalos, problemas e dificuldades. Isso cria agitação e traz a tona as tendências e vṛttis da mente, que permanece tensa e perturbada durante todo o dia. É como jogar uma pedra nas águas calmas do lago, criando ondulações.

Quando a mente está quieta e em paz, sensitiva e receptiva, sementes positivas podem ser plantadas no subconsciente. Mahāmṛtyuñjaya, gāyatrī e durgā-mantras são saṅkalpas ou resoluções para saúde física e bem-estar mental, sabedoria e clareza interior, e superação das dificuldades na vida. Praticando mantra-sādhanā como a primeira atividade no dia, você obterá coragem, força interior e paz. Suas amizades e relacionamentos irão melhorar. Você crescerá e encontrará equilíbrio. Estará no controle de sua vida e mente.

Para o mantra-sādhanā, nenhuma preparação é necessária. Praticando estes três mantras pela manhã, antes de se levantar da cama ou ir ao banheiro, estará transcendendo sua natureza condicionada. Nos impomos muita disciplina e expectativas sobre nós mesmos. Deus irá ver a pureza de seu coração e a força de sua fé e convicção. Comece o dia desta maneira:

Mantra-sādhanā da manhã

Quando acordar pela manhã:

1.    Foque o centro entre as sobrancelhas. Inspire e expire profundamente sete vezes. Relaxe a cada expiração.
2.    Entoe o Oṃ três vezes, concentrando em sua vibração. Sinta como se a entoação estivesse criando um campo de força ao redor do corpo.
3.    Inspire e expire profundamente mais sete vezes e relaxe o corpo.
4.    Faça um saṅkalpa para saúde física e bem-estar mental e entoe o mahāmṛtyuñjaya-mantra 11 vezes.
5.    Faça um saṅkalpa para sabedoria, clareza interior e conhecimento intuitivo e entoe o gāyatrī-mantra 11 vezes.
6.    Faça um saṅkalpa para superação e remoção das dificuldades da vida e entoe o durgā-mantra 3 vezes.
7.    Inspire e expire profundamente sete vezes e relaxe o corpo.

Repita o mesmo processo a noite, antes de dormir.

महामृत्युञ्जय मन्त्र
त्र्यम्बकं यजामहे सुगन्धिं पुष्टिवर्धनम्।
उर्वारुकमिव बन्धनात् मृत्योर्मुक्षीय मामृतात्॥

Mahāmṛtyuñjaya Mantra (saṅkalpa para cura, poder, imunidade e força)

oṃ tryambakaṃ yajāmahe sugandhiṃ puṣṭivardhanam |
urvārukamiva bandhanāt mṛtyormukṣīya māmṛtāt ||

गायत्री मन्त्र
भूर् भुवः स्वः तत्सवितुर्वरेण्यं।
भर्गो देवस्य धीमहि धियो यो नः प्रचोदयात्॥

Gāyatrī Mantra (saṅkalpa para sabedoria, clareza interior, conhecimento intuitivo, aprendizado)

oṃ bhūr bhuvaḥ svaḥ tatsaviturvareṇyaṃ |
bhargo devasya dhīmahi dhiyo yo naḥ prachodayāt ||

दुर्गाद्वात्रिंशन्नाममाला
दुर्गा दुर्गार्तिशमनी दुर्गापद्विनिवारिणी। दुर्गमच्छेदिनी दुर्गसाधिनी दुर्गनाशिनी।
दुर्गतोद्धारिणी दुर्गनिहम्त्री दुर्गमापहा। दुर्गमज्ञानदा दुर्ग दय्तिलोकदवानला।
दुर्गमा दुर्गमालोका दुर्गमात्मस्वरूपिणी। दुर्गमार्गप्रदा दुर्गमविद्या दुर्गमाश्रिता।
दुर्गमज्ञानसंस्थाना दुर्गमध्यानभासिनी। दुर्गमोहा दुर्गमगा दुर्गमार्थस्वरूपिणी।
दुर्गमासुरंहन्त्री दुर्गमायुधधारिणी। दुर्गमाण्गी दुर्गमता दुर्गम्या दुर्गमेश्वरी।
दुर्गभीमा दुर्गभामा दुर्गभा दुर्गदारिणी।

Durgādvātriṃśannāmamālā (saṅkapa para superação de dificuldades, paz e harmonia na vida)

oṃ durgā durgārtiśamanī durgāpadvinivāriṇī| durgamachchhedinī durgasādhinī durganāśinī|
durgatoddhāriṇī durganihamtrī durgamāpahā| durgamajñānadā durga daytialokadavānalā|
durgamā durgamālokā durgamātmasvarūpiṇī| durgamārgapradā durgamavidyā durgamāśritā|
durgamajñānasaṃsthānā durgamadhyānabhāsinī| durgamohā durgamagā durgamārthasvarūpiṇī|
durgamāsuraṃhantrī durgamāyudhadhāriṇī| durgamāṇgī durgamatā durgamyā durgameśvarī|
durgabhīmā durgabhāmā durgabhā durgadāriṇī|

Prática: mantra-yoga
Estágio 1: preparação
Sente-se confortavelmente em uma postura meditativa.
Coloque as mãos sobre os joelhos em cin ou jñāna-mudrā.
Mantenha as costas eretas e a cabeça no prolongamento da coluna.
A partir deste momento, feche os olhos. Mantenha os olhos fechados durante toda a prática.
Mantenha-se firme, estável na postura, ao mesmo tempo que confortável. Faça o possível para não fazer movimentos desnecessários. Mantenha-se firme como uma estátua.
Não se preocupe se sua mente vaguear e nem deixe sua atenção se perder em qualquer tipo de barulho.
A base de nossa meditação e relaxamento neste momento é a repetição mântrica.
Nesta prática você terá de visualizar um som particular. Este som será à base dos movimentos no seu plano mental. O som, o mantra, se tornará o centro de sua consciência.
Este centro se encontra no ponto entre suas sobrancelhas, é o ājñā-cakra.
Para nossa prática, utilizaremos a nota da escala musical dha (o equivalente indiano do nosso la).
Visualize a imagem da nota dha de forma ritmada no cidākāśa, a tela negra na frente de seus olhos fechados.
O ritmo não deve ser muito lento ou rápido. Continue entoando e visualizando o mantra dha no cidākāśa (pausa).
Interrompa o movimento do ritmo de entoação e visualização e perceba a vibração pulsante do mantra no cidākāśa. Fixe sua concentração no ponto entre as sobrancelhas: dha, dha, dha, dha..., sem parar, incessantemente (pausa).
Diferentes tipos de pensamento irão aparecer tentando retirar sua consciência da prática.
Não se preocupe, não reaja a estes construtos de pensamento. Eles podem exercer grande domínio sobre sua mente. Mas esteja alerta.
Traga a consciência para o ritmo do mantra no cidākāśa, focando sua atenção no ponto entre as sobrancelhas.
Visualize a imagem da nota dha de forma ritmada no cidākāśa.
O ritmo não deve ser muito lento ou rápido. Continue entoando e visualizando o mantra dha no cidākāśa (pausa).
Novamente, pensamentos poderão intervir no fluxo de sua concentração.
Não reaja, mantenha-se como uma testemunha de todo processo. Concentre-se no ritmo, no movimento do som no cidākāśa (pausa).
A partir deste momento, como um exemplo, vamos entoar o mantra oṃ em voz alta. O mantra deve se tornar tão claro que, após pararmos de entoar em voz alta, ele continua pulsando ritmicamente no cidākāśa.
Estágio 2: entoando o mantra
Entoaremos o mantra oṃ algumas vezes em voz alta. A entoação verbal servirá de exemplo para entoação mental.
Foque sua mente na vibração do mantra e nada mais. Transfira a vibração do mantra verbalmente entoado para o corpo mental, direcionando a consciência no cidākāśa, exatamente no ponto entre as sobrancelhas, na sua tela mental. A vibração e vocalização são reforçadas pela projeção do símbolo do oṃ no cidākāśa.
Vocalizamos todos juntos. Inspiramos: oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ. Mantenha sua consciência na vibração do mantra e na projeção se seu símbolo no cidākāśa (pausa).
Quando nos concentramos nesta prática por alguns minutos, a consciência é rapidamente introvertida.
A partir deste momento, eu entoarei o mantra oṃ. Me acompanhem mentalmente. Não vocalizem o mantra. Dirija sua consciência para o cidākāśa e mentalmente vibre o mantra com seu símbolo enquanto eu entôo os mantras: oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ, oṃ (pausa).
Mentalmente continue entoando o mantra e visualizando seu símbolo no cidākāśa.
Entoe ritmicamente o mantra, incessantemente. Não se preocupe com pensamentos estranhos.
Estágio 3: fim da prática
Levamos as mãos na frente do peito em namaskāra-mudrā.
Entoamos o mantra oṃ três vezes: oṃ, oṃ, oṃ.
Relaxe a mente e vagarosamente tome consciência do ambiente ao seu redor.
Espreguice todo o corpo e abra os olhos.


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