Fernando Liguori
A Āyurveda considera o diabetes como uma disfunção sistêmica que
afeta a água no corpo (ambhuvaha srotas) ou um desequilíbrio no
metabolismo aquático. O diabético geralmente sofre de urina profusa por conta deste
desequilíbrio. A Āyurveda lista inúmeros distúrbios que podem causar o
diabetes em concordância com os doṣas. Ela classificada de duas
maneiras: diabetes insipidus e diabetes mellitus.
Classificação corrente
O diabetes
insipidus (DI) é causada quando a glândula pituitária tem um problema na
produção do hormônio vasopressina, também conhecido como AVP, ou quando
a ação do AVP não funciona mais eficientemente nos rins. Isto significa que o
corpo produz uma maior quantidade de urina pelos rins, porque não são capazes
de reter a água.
É importante
salientar que o diabetes insipidus não está relacionada com o diabetes
mellitus, exceto que, quando não tratada, pacientes com ou condição de pode
ter os sintomas de sede extrema e da necessidade de urinar frequentemente. No diabetes
insipidus não há qualquer problema com o nível de glicose ou de insulina no
sangue.
O diabetes insipidus
é muito menos comum do que o diabetes mellitus. Em muitos casos não há
uma causa óbvia para a incapacidade da pituitária produzir o AVP (algumas vezes
chamado hormônio anti-diurético ou ADH). Em outras pessoas uma inflamação ou
infecção em torno da glândula pituitária, ou uma lesão na cabeça pode levar à
perda da secreção de AVP. Operações sobre a glândula pituitária também podem
levar à diabetes insipidus, mas, como no caso de uma lesão na cabeça,
esta é muitas vezes temporária.
O diabetes mellitus (DM) não e uma única
doença, mas um grupo heterogêneo de distúrbios metabólicos que apresentam em comum
à hiperglicemia. Essa hiperglicemia é o resultado de defeitos na ação da
insulina, na secreção de insulina ou em ambos.
A classificação atual do DM é baseada na etiologia e
não no tipo de tratamento, portanto os termos diabetes mellitus insulinodependente
e diabetes mellitus insulinoindependente devem ser eliminados. A
classificação proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela
Associação Americana de Diabetes (ADA) e aqui recomendada inclui quatro classes
clinicas: DM tipo 1, DM tipo 2, outros tipos específicos de DM e diabetes
mellitus gestacional. Ainda existem duas categorias, referidas como pré-diabetes,
que são a glicemia de jejum alterada e a tolerância à glicose
diminuída. Essas categorias não são entidades clínicas, mas fatores de
risco para o desenvolvimento do DM e de doenças cardiovasculares (DCV).
O DM tipo 1 (DM1), forma presente em 5 a 10% dos
casos. É o resultado de uma destruição das células beta pancreáticas com consequente
deficiência de insulina. Na maioria dos casos essa destruição das células beta é
mediada por auto-imunidade, porém existem casos em que não há evidencias de
processo auto-imune, sendo, portanto, referida como forma idiopática do DM1. Os
marcadores de auto-imunidade são os auto-anticorpos: antiinsulina, antidescarboxilase
do acido gluta-mico (GAD 65) e antitirosina-fosfatases (IA2 e IA2B). Esses
anticorpos podem estar presentes meses ou anos antes do diagnostico clínico, ou
seja, na fase pré-clínica da doença, e em ate 90% dos indivíduos quando a
hiperglicemia é detectada. Alem do componente auto-imune, o DM1 apresenta forte
associação com determinados genes do sistema antígeno leucocitário humano
(HLA), alelos esses que podem ser predisponentes ou protetores para o
desenvolvimento da doença.
A taxa de destruição das células beta é variável,
sendo em geral mais rápida entre as crianças. A forma lentamente progressiva
ocorre geralmente em adultos e é referida como latent autoimmune diabetes in
adults (LADA).
O DM1 idiopático corresponde a uma minoria dos casos.
Caracteriza-se pela ausência de marcadores de auto-imunidade contra as células
beta e não-associação com haplótipos do sistema HLA. Os indivíduos com essa
forma de DM podem desenvolver cetoacidose e apresentam graus variáveis de deficiência
de insulina.
Como a avaliação dos auto-anticorpos não é disponível
em todos os centros, a classificação etiologica do DM1 nas subcategorias auto-imune
e idiopático pode não ser sempre possível.
O diabetes
mellitus tipo 2 (DM2) é a forma presente em 90 a 95% dos casos e
caracteriza-se por defeitos na ação e na secreção da insulina. Em geral ambos
os defeitos estão presentes quando a hiperglicemia se manifesta, porem pode
haver predomínio de um deles. A maioria dos pacientes com essa forma de DM apresenta
sobrepeso ou obesidade, e cetoacidose raramente desenvolve-se espontaneamente, ocorrendo
apenas quando associada a outras condições como infecções. O DM2 pode ocorrer
em qualquer idade, mas é geralmente diagnosticado após os 40 anos. Os pacientes
não são dependentes de insulina exógena para sobrevivência, porem podem
necessitar de tratamento com insulina para a obtenção de um controle metabólico
adequado.
Diferentemente
do DM1 auto-imune não há indicadores específicos para o DM2. Existem provavelmente
diferentes mecanismos que resultam nessa forma de DM, e com a identificação futura
de processos patogênicos específicos ou defeitos genéticos, o numero de pessoas
com essa forma de DM irá diminuir a custa de uma mudança para uma classificação
mais definitiva em outros tipos específicos de DM.
Classificação
ayurvédica
O diabetes se manifesta inicialmente como excesso de sede e urina. No
começo o diabetes se manifesta como um distúrbio de kapha, causado pelo
consumo excessivo de açúcar, comidas kaphogênicas e pela obesidade. Kapha
aumenta no estômago devido à incapacidade funcional do pâncreas, atingindo
outros tecidos, causando excesso e turvação de urina.
O diabetes de longo prazo ou até mesmo o juvenil se apresenta como excesso
de sede e perda de tecidos, se tornando um distúrbio de vāta,
principalmente no diabetes mellitus. Vāta se acumula no intestino
grosso e atinge o pâncreas, perturbando suas funções.
Pitta
também pode causar diabetes de ambos os tipos. Pitta se acumula no
intestino delgado e atinge o fígado e o pâncreas, perturbando suas funções.
Além disso, o agni elevado de pitta pode queimar o pâncreas.
Tratamento geral para diabetes
A melhor erva e a mais comum utilizada para harmonizar as funções do
fígado e do pâncreas é o açafrão. Toma-se o açafrão em pó (1 a 3 gramas) três
vezes ao dia com um pouco de suco ou gel de ale vera.
A principal erva ayurvédica para complicações severas de longo
prazo é a shilajit, usualmente ingerida na forma composta. Outra
importante erva ayurvédica é a gurmar. Ela possui propriedades
anti-diabéticas e é objeto de estudo internacional por doutores e cientistas na
área da Āyurveda. Sushrut, um grande médico ayurvédico do
passado, descobriu a eficácia da gurmar em destruir a ação do açúcar no
organismo (gur-mar significa a destruidora de açúcar). Ela contém
o aumento do nível de açúcar no sangue. É usualmente administrada com shilajit
(faz parte do composto de shilajit).
A maioria das substâncias amargas ajudam a controlar o metabolismo do
açúcar, principalmente a genciana. Especiarias como gengibre e cardamomo
auxiliam na digestão dos açucares. Guggul e mirra são úteis no
controle da obesidade e possuem propriedades que regulam a taxa de açúcar no
sangue.
Na terapia com gemas, pedras conectadas a Júpiter como a safira ou o
topázio amarelo auxiliam o corpo a metabolizar o açúcar. Geralmente são usadas
com estrutura de ouro no dedo indicador da mão direita.
Tratamento yogī para diabetes
1. meditação
A mente, através do sistema nervoso, controla todas as ações e reações que
ocorrem no organismo humano. Ela mantém um registro de tudo o que a pessoa e
seu corpo experienciaram no passado e apresenta isso, no presente, em condições
que refletem essas experiências. Dessa função vem as decisões que regulam todas
as ações, sejam elas voluntárias ou involuntárias. Essa função se estende desde
o inconsciente e controle automático dos órgãos e músculos até as decisões
tomadas conscientemente. Todo funcionamento existencial está baseado nas
funções do sistema nervoso.
A ciência do Yoga sustenta que o sistema nervoso (e o corpo que ele
regula) pode ser mantido sob controle e pode operar em sua máxima capacidade de
eficiência através da prática da meditação. Essa teoria antiga já foi reforçada
por pesquisas científicas conduzidas na Índia, Europa, América e outros países.
Grandes partes destas pesquisas demonstraram de forma conclusiva que a prática
diária da meditação provoca uma mudança harmoniosa no organismo humano.
No que concerne o diabetes, a prática meditativa demonstrou seu auxílio
definitivo na regulação das glândulas endócrinas através do relaxamento do
sistema nervoso simpático em práticas como, por exemplo, ajapa-japa. Os
hormônios hipofisários, que estão sob o controle direto do hipotálamo, são
drasticamente afetados e regulados pela prática de yoga-nidrā. Além
disso, um aumento da eficiência mental é reconhecidamente adquirido através
destas práticas.
2. haṭha-yoga
De igual importância no tratamento do diabetes são as práticas do haṭha-yoga
denominadas śankhaprakṣalana e kunjal-kriyā. A prática de śankhaprakṣalana
limpa sistematicamente o trato alimentar que vai da boca ao ânus. Neste kriyā,
uma grande quantidade de água salinizada, morna, é ingerida, dois copos por
vez, alternando com cinco āsanas especiais. Estes āsanas abrem os
músculos dos esfíncteres que controlam os movimentos digestivos e intestinais,
o que faz com que a água passe rapidamente por todo o trato. Após alguns copos
e movimentos com os āsanas, o praticamente começa a ir ao banheiro e
expelir o conteúdo do intestino misturado com a água. A prática só se torna
efetiva quando já não há material intestinal (fezes), e a água sai limpa e
cristalina pelo ânus assim como entrou pela boca.
Em conjunto com a meditação e o śankhaprakṣalana, uma série de āsanas
e prāṇāyāmas deve ser administrada no tratamento do diabetes. As
posturas ajustam as funções dos órgãos envolvidos pela regulação dos impulsos
nervosos e fluxo sanguíneo nas áreas glandulares e pela massagem sutil que
proporciona nas glândulas e órgãos. Prāṇāyāma controla a energia
corporal, permitindo o fluxo livre das forças vitais para as áreas que requerem
energia extra. O cérebro, o pâncreas e os outros órgãos podem ser revitalizados
conscientemente e sistematicamente.
Programa de práticas yogīs para diabetes
O programa terapêutico que se segue tem sido utilizado pela Bihar
School of Yoga no tratamento do diabetes e no fortalecimento do corpo e da
mente debilitados pela doença. A prática do Yoga possui efeitos poderosos
que provocam mudanças profundas e sutis no complexo corpo-mente. Portanto, cada
aspecto da prática deve ser selecionado apropriadamente e executado
cuidadosamente. De outra maneira, o objetivo desejado não será alcançado e sob
algumas circunstâncias, o efeito pode ser contrário. O programa de yoga-terapia
para diabetes deve ser prescrito individualmente segundo cada caso e deve ser supervisionado
por um professor qualificado. Ao mesmo tempo, as práticas devem ser aprendidas
corretamente e executadas de maneira suave e relaxante.
O programa de práticas é dividido em três estágios e existe um avanço nas
técnicas de cada um deles. Três meses são recomendados para cada estágio e este
tempo pode ser prolongado levando em consideração as necessidades individuais.
Apenas avance para o próximo estágio após ter executado todas as técnicas do
estágio anterior com facilidade, sem tensão física ou mental, pelo período de
pelo menos um mês de proficiência. Isso significa que cada estágio será
executado no término de quatro meses. Isso garantirá muitos benefícios
terapêuticos. Na medida em que se familiarizar com as práticas você será capaz
de ajustar o programa segundo suas necessidades. Quando avançar para os
estágios dois e três, as práticas do primeiro estágio podem continuar sendo
executadas. Seu valor e efeito não devem ser negligenciados. Você notará que as
práticas de Yoga não são difíceis de executar. O que se requer é tempo e
certo grau de esforço. Mantendo um sentido de continuidade na execução do
programa você se sentirá ricamente renovado pelas mudanças que elas irão
proporcionar.
Este programa terapêutico é destinado às pessoas que não possuem
complicações severas no diabetes, quer dizer, sem a associação de qualquer
outra desordem como hipertensão, doenças cardíacas, pressão alta. Se você
possui qualquer outro problema além do diabetes, consulte um yoga-terapeuta
qualificado para uma orientação apropriada antes de dar início às práticas.
Este é o caminho mais seguro e mais rápido que encontramos para mantê-lo em
segurança sob quaisquer circunstâncias. Esteja a par das contraindicações de
cada técnica e consulte seu yoga-terapeuta. Como os efeitos do Yoga
são cumulativos, os níveis de açúcar no sangue podem cair drasticamente.
Lembre-se: o tratamento do diabetes através do Yoga é um processo que envolve
técnica. Ele não deve ser executado sem a devida orientação de um professor de Yoga
qualificado. Todas as práticas devem ser aprendidas diretamente de um professor
de Yoga. O programa e as técnicas sugeridas a seguir servem apenas como
orientação. O yoga-terapeuta saberá onde deve mexer na estrutura do
programa que agora esboçamos.
Estágio 1
1. Jala-neti: diariamente.
2. Śankhaprakṣalana: comece após um mês de prática (duas
vezes por semana durante um mês e depois uma vez por semana até o fim do
tratamento.
3. Tadāsana: três ciclos.
4. Trikonāsana: três ciclos. Inicie com a variação 3
e gradualmente execute as variações 1 e 2.
5. Utthita-lolāsana: cinco ciclos.
6. Kati-cakrāsana: cinco ciclos.
7. Pavanmuktāsana 1: seis a dez ciclos.
8. Pavanmuktāsana 2: toda a série, duas vezes cada
movimento, pelo período mínimo de duas semanas. Execute de três a oito ciclos.
9. Marjarī-āsana: cinco a oito ciclos.
10. Bhujaṃgāsana: três ciclos.
11. Śaśankāsana: dez a vinte e sete respirações
abdominais nesta postura.
12. Meru-vakrāsana: onze ciclos.
13. Respiração yogī em śavāsana: vinte e sete ciclos.
14. Nāḍī-śodhana-prāṇāyāma: técnica 1 e 2 – 1:1. Comece com uma
contagem confortável e gradualmente aumente o tempo até 10:10. Doze ciclos.
15. Bhrāmarī-prāṇāyāma: doze ciclos.
16. Mūla-bandha: dez ciclos.
17. Relaxamento | yoga-nidrā.
Estágio 2
1. Jala-neti: em dias alternados.
2. Śankhaprakṣalana e kunjal-kriyā (com jala-neti):
duas vezes por semana por um mês; depois, uma vez por semana.
3. Sūrya-namaskāra: três a cinco ciclos.
4. Śavāsana com respiração abdominal até que os
batimentos cardíacos e a respiração se normalizem.
5. Śaśank-bhujaṃgāsana: cinco ciclos.
6. Naukāsana: três ciclos.
7. Tadagi-mudrā: três ciclos x 10.
8. Gomukāsana: uma vez para cada lado aumentando
gradualmente a permanência na posição final.
9. Ardha-matsyendrāsana: uma vez para cada lado aumentando
gradualmente a permanência na posição final.
10. Viparītakaraṇī-āsana: dez segundos a um minuto.
11. Matsyāsana: dez segundos a um minuto.
12. Agnisar-kriyā: comece com swana-prāṇāyāma
e após um mês agnisar. Dez a vinte respirações, três ciclos.
13. Nāḍī-śodhana-prāṇāyāma: técnica 2 – 1:2. Gradualmente
desenvolva a técnica 3 – 1:1:1, cinco ciclos.
14. Bhrāmarī-prāṇāyāma: doze ciclos ou ujjayī-prāṇāyāma
por cinco minutos.
15. Mūla-bandha: técnica 2 com retenção interna. Cinco
ciclos.
16. Relaxamento | yoga-nidrā.
17. Ajapa-japa: técnica 1 (passagem frontal, estágios 1, 2 e
3), um mês para cada estágio. Dez a quinze minutos à noite.
Estágio 3
1. Jala-neti: duas vezes por semana.
2. Śankhaprakṣalana e kunjal-kriyā: uma veze na
semana ou de quinze em quinze dias, dependendo das necessidades.
3. Sūrya-namaskāra: cinco a doze ciclos.
4. Śavāsana com respiração abdominal por vinte e
sete fôlegos.
5. Pavanmuktāsana 2: toda a série.
6. Supta-urdarakarśanāsana: cinco ciclos.
7. Dhanurāsana: três ciclos, aumentando gradualmente
a permanência na postura final.
8. Paścimottānāsana: três
ciclos.
9. Sarvāṅgāsana
| viparītakaraṇī-āsana: de dez segundos a um minuto.
10. Matsyāsana: de dez
segundos a um minuto.
11. Yogamudrāsana: de dez
segundos a um minuto.
12. Gomukhāsana: uma vez
para cada lado.
13. Ardha-matsyendrāsana: uma vez para cada lado aumentando
gradualmente a permanência na posição final.
14. Bhastrikā: três a cinco ciclos de vinte fôlegos.
No segundo mês introduza jālaṃdhara e
mūla-bandha no fim de cada ciclo.
15. Nāḍī-śodhana-prāṇāyāma: técnica 3 – 1:1:2 estendendo,
eventualmente, para 1:2:2. Cinco ciclos.
16. Bhrāmarī-prāṇāyāma: doze ciclos ou ujjayī-prāṇāyāma
por cinco minutos.
17. Relaxamento | yoga-nidrā.
18. Ajapa-japa: técnica 2 (passagem espinhal, estágios 1, 2 e
3), um mês para cada estágio. Dez a vinte minutos à noite.
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