Fernando Liguori
Extrato da apostila do Curso de
Aprofundamento em Yoga & Āyurveda realizado pelo Instituto Kaula em 2012.
Seguindo o curso da construção de nosso sādhanā, o próximo estágio da prática é a meditação. Aqui, quando
nos referimos ao nome genérico meditação,
queremos dizer grupo de práticas
meditativas que seguem os passos do sapta-sādhanā
proposto por nós. Primeiro nós abordaremos as práticas meditativas que introvertem
a mente e os sentidos, que fazem com que nós empreendamos uma jornada em nosso interior para descobrirmos quem somos verdadeiramente. As práticas
preliminares são as de relaxamento mental (pratyāhāra).
Estas técnicas nos capacitam a estarmos
dentro de nós mesmos longe do tumulto do mundo, encontrando paz em nosso
interior. Este é um início necessário para práticas mais avançadas de:
·
Consciência
unidirecionada (dhāraṇā)
·
Meditação (dhyāna)
·
Iluminação (samādhi)
Estes são estágios de aprofundamento da consciência até a realização do samādhi, o estado transcendental de
iluminação espiritual. Muitas pessoas estão longe de atingir este nível de
realização, entretanto, as práticas que proporcionam este estado são boas para
todos nós.
Pratyāhāra é o estágio de entrada na meditação profunda. É o alicerce fundamental de todas as
práticas meditativas, formando o substrato de todas elas. É um estágio, uma
condição espiritual que se divide em quatro etapas:
1. Primeiro,
nós começamos a desenvolver consciência. A definição clássica de pratyāhāra
é a retirada ou abstração dos sentidos. Tem sido dito que assim como uma tartaruga
é capaz de recolher todos os seus membros para dentro do casco, da mesma forma
o yogī deveria ser capaz de recolher
toda extensão dos sentidos e da mente do exterior para o interior. Contudo, se nós aplicamos a lógica comum a
este processo, nós iremos entender que não é uma simples questão de se desligar
de tudo e se fechar para o mundo exterior. É antes de tudo se tornar consciente
do que está acontecendo externamente e como nós estamos reagindo. Então, na
primeira etapa de pratyāhāra, os
sentidos são plenamente estendidos ao mundo externo, permitindo-nos
experimentar sua completa atividade, seja no sentido do tato, paladar, visão,
olfato ou audição.
2. Segundo,
nós observamos nossas reações aos estímulos sensoriais. Por exemplo, se surgisse um repentino e agradável aroma de
rosas na sala, a maioria de nós faríamos uma profunda respiração e diríamos: Oh! É apenas um cheiro, mas este cheiro
desperta muitas reações dentro de nós. Um sentimento, uma expressão, uma lembrança
podem estar associados ao sentido do olfato. Logo, muitas reações diferentes se
manifestam ao mesmo tempo, ao passo que nós nem mesmo percebemos todas elas. Se
sentirmos o cheiro de carne estragada iremos nos levantar, colocar nossa cabeça
para fora da janela e dizer yrk! A
mesma coisa está acontecendo novamente. Se algo é suave e agradável, temos a
sensação de prazer. Se algo é áspero de desagradável, não queremos tocá-lo.
Essas são reações comuns, mas ao mesmo tempo são profundas reações aos estímulos
sensoriais externos. Na segunda etapa de pratyāhāra,
após nós termos expandido nossos sentidos externamente, temos que aprender como manter nosso equilíbrio, como desenvolver
imunidade as influências dos sentidos, que são externas por natureza.
3. Terceiro,
nós recolhemos a consciência das experiências externas para as experiências
internas dos sentidos. Começamos a ver a
conexão que uma experiência sensorial tem com nossa mente interior. Como o
cheiro desperta memória? Como um cheiro incita a sensação de prazer ou aversão?
O reconhecimento e a percepção do
processo mental associado com os sentidos é a terceira etapa de pratyāhāra.
4. Quarto,
nós percebemos e harmonizamos as atividades interiores. Depois de ter reconhecido o que experimentamos interna e externamente,
e após termos desenvolvido imunidade, nós começamos a etapa final de pratyāhāra. É a experiência de śūnya, o nada ou vazio, ganhando
controle sobre as ações e reações inconscientes dos sentidos e da mente,
interrompendo assim suas interações. Śūnya
é apenas a transição de um estado de meditação para o outro, da consciência
para concentração e a concentração se inicia com dhāraṇā.
No exercício de pratyāhāra,
portanto, podemos seguir o seguinte esquema de práticas:
1. Meditações concentradas
2. Meditações abertas
As práticas de meditação concentrada
focam a consciência em um ponto, excluindo todas as interferências externas.
Aqui incluem técnicas como mantra-yoga
(japa e ajapa-japa), visualização
interior etc.
As práticas de meditação aberta,
ao invés de focar a consciência, permitem que ela esteja aberta a qualquer
interferência como os pensamentos, sons, emoções etc. O meditante observa estas
interferências como uma testemunha imparcial, um observador, não se envolvendo,
sem emitir julgamentos. Isso produz uma limpeza
nos recessos mais profundos da mente inconsciente. Um exemplo perfeito disso é
a observação espontânea dos pensamentos (antar
mouna) ou a visualização interior
espontânea.
As meditações concentradas e abertas não se excluem. Ambas têm de ser
executadas. Ademais, não é possível atingir níveis elevados de meditação
concentrada (dhyāna e samādhi) até que tenhamos purificado, em
grande parte, a mente interior, pois seus distúrbios forçam a consciência
quando tentamos nos concentrar.
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