Swāmi Santaram Saraswatī
Recentemente, um
grande número de livros e revistas têm sido publicados a respeito de
investigações sobre a realidade da kuṇḍalinī. Infelizmente, muito do que
está sendo escrito mostra apenas um conhecimento muito infantil, preliminar e
parcial do processo de despertar real. Em muitos textos, o prāṇotthana
ou liberação da força prânica no corpo tem sido confundido com o despertar real
da kuṇḍalinī. Prāṇotthana é o primeiro acontecimento na evolução
individual e é esta liberação de energia que desencadeia o despertar real da kuṇḍalinī.
Sem prāṇotthana a kuṇḍalinī não é despertada.
Há duas maneiras
pelas quais prāṇotthana pode ocorrer. A primeira é através da prática
regular de āsana, prāṇāyāma, concentração e técnicas de
meditação. Através destas práticas, o prāṇa é gradualmente liberado no
organismo, iniciando o processo preliminar de purificação dos órgãos, glândulas,
sistema nervoso, cérebro e nāḍīs. A purificação completa só vem com o
despertar da kuṇḍalinī em sua subida para o cérebro.
A segunda maneira
em que prāṇotthana ocorre é por śaktipāta, o despertar da energia
efetuado por um guru. O śaktipāta não desperta diretamente a kuṇḍalinī,
só libera o prāṇa do discípulo. No entanto, é este prāṇa em
movimento que desperta a kuṇḍalinī. O tempo que leva para isso ocorrer depende
das impurezas físicas e mentais do discípulo, bem como sobre a sua atitude para
com o guru que lhe conferiu o śaktipāta e para este novo processo de
trabalho em si.
Se o prāṇotthana
ocorre por esforços individuais «tapaḥ» ou pela ativação do próprio prāṇa
por um guru, o fato é que este não é o despertar da kuṇḍalinī como
muitas pessoas estão dizendo. A confusão surgiu porque, talvez, o processo e
efeito que o prāṇotthana tem sobre o corpo e a mente do indivíduo é um
pouco semelhante ao início do despertar da kuṇḍalinī. Alguns livros
afirmam que essa energia – a kuṇḍalinī – despertou e subiu ao cérebro, imediatamente
ou após algumas tentativas, em muitos indivíduos. No entanto, essas pessoas
continuam com suas vidas normais, além de uma melhora na saúde e clareza
mental. Isso mostra que não era a kuṇḍalinī que subiu ao cérebro, mas a
força prânica ou prāṇotthana. Esta força segue os mesmos caminhos como o
faz a kuṇḍalinī. Ela inicia-se no mūlādhāra e sobe pela coluna, purificando
os cakras parcialmente, mas não completamente, até que atinja o cérebro.
Esta força prânica, portanto, torna mais fácil o processo de purificação pela kuṇḍalinī,
que acontecerá em um momento posterior.
Na medida em que a
força prânica os purifica, cria movimentos automáticos no corpo, āsanas
espontâneos, prāṇāyāmas, visões de luzes etc., uma vez que encontra
bloqueios psicológicos e fisiológicos. Uma vez que o prāṇotthana cessou seu
trabalho inicial de purificação, o sistema normalmente se estabiliza por um
tempo antes de começar o trabalho real com a kuṇḍalinī. Depois de um
tempo a kuṇḍalinī desperta. Com o despertar da kuṇḍalinī, os
movimentos espontâneos, mudrās, bandhas, prāṇāyāmas,
geração de uma grande quantidade de calor, as visões psíquicas etc. começam a
ocorrer. Mas estes são de natureza mais intensa e mais profunda do que aqueles
causados pelo prāṇotthana. É agora que a meditação espontânea ocorre
e não antes. É agora que a purificação verdadeira ocorre e o estado de
consciência do indivíduo muda radicalmente. Um estado superior de consciência
amanhece automaticamente no indivíduo e seu comportamento, as relações com o
seu ambiente, a compreensão das coisas etc. muda completamente. Ele
definitivamente parece ser uma personalidade diferente. Poderosas mudanças
ocorrem em todos os campos de sua fisiologia e psicologia. Automaticamente, o
homem começa a se tornar mais sutil e espiritual ou, por outro lado, começa a
se comportar como um neurótico. Se ele ainda tem muitos bloqueios – não ter se
purificado pela prática de āsanas, prāṇāyāmas, mudrās, bandhas,
concentração, karma-yoga etc. – o despertar pode causar
insanidade temporária. Tais pessoas podem passar algum tempo no manicômio.
Esses casos extremos ocorrem quando os indivíduos inexperientes tentam
despertar a kuṇḍalinī através de métodos não científicos, sem qualquer
preparação. No entanto, quando devidamente iniciado e guiado por um guru
experiente, o despertar da kuṇḍalinī é um renascimento espiritual para o
aspirante.
No entanto, tudo
não termina aqui. Despertar a kuṇḍalinī em si não é uma coisa difícil, o
que é importante é a ascensão da energia através da passagem suṣumṇā e
isso não é fácil, realmente não é. O despertar pode ser efetuado por qualquer
guru ou por seus próprios esforços no Yoga. Mas o que há de errado então?
A subida através da suṣumṇā está entupida com saṃskāras e impurezas
físicas e psíquicas. Estes bloqueios são os obstáculos que a própria kuṇḍalinī
terá de transpassar e queimar. Este processo irá afetar o aspirante de muitas
maneiras, causando grande transformação física, visões psíquicas, experiências,
doenças estranhas, inconsciência etc., tudo isso dependendo das impurezas que
ele tem sobre os diferentes níveis de seu ser. Mas estas são apenas coisas
transitórias, que vão embora da maneira que vieram, deixando uma consciência
purificada.
Verdadeiramente,
esta é a energia da evolução, sem a qual o homem vai permanecer ordinário, com suas
faculdades latentes e adormecidas permanentemente. Uma vez que você colocar o
pé nesse caminho, nunca mais vai querer voltar.
Tradução livre de Fernando Liguori.
0 comentários:
Postar um comentário